sexta-feira, 15 de abril de 2011

Sussurro Imperceptível


Sentou-se na cama e curvou a cabeça de encontro às palmas das suas mãos. Estava perante uma angústia mental inconcebível aos olhos dos inscientes que se passeiam lá fora. Dolorosamente, arrastou-se até à janela e, num esforço desumano, tentou beber o ar que o circundava no parapeito da janela. Cerrou os olhos e sentiu o oxigénio caminhar cautelosamente desde as suas narinas até aos pulmões. O sol desceu e iluminou aquela face hedionda e triste. As crianças da rua apontavam para ele e apressavam-se em caminhar pela calçada sem tirar os olhos daquele pobre anjo canceroso. Numa tentativa de devolver o sorriso que uma criança, respeitosamente, lhe dedicou, as comissuras dos seus lábios abriram de tal forma que começaram a sangrar. Retomou à protecção do seu casulo e deixou-se cair sobre a cama. Num gesto transcendente, o seu olhar conseguiu libertar-se das amarras da dor que contorcia o seu corpo, e ancorar-se no tecto do seu quarto. Observou aquele branco disforme e, desde então, pôde sentir-se levitar em direcção ao branco profundo… tão profundo que nunca mais se sentiu regressar.

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