Começo por admitir que não é
nada habitual trazer a negra e cavernosa esfera do Black Metal para o universo El
Coyote, mas muito ocasionalmente sou surpreendido, varrido e
consequentemente conquistado por um determinado registo cujo impacto me obriga
não só a vivenciá-lo com total apego e fascínio, mas a transcrevê-lo para o domínio
lírico. E foi isto que sucedera depois de comungado e venerado o terceiro e
novo álbum dos norte-americanos Wayfarer.
Lançado em território primaveril do presente ano pelo selo discográfico
independente e de proveniência canadiana Profound Lore Records
na forma física de CD e vinil, ‘World’s Blood’ sustenta todo um obscuro,
melancólico, misantrópico e aflitivo Black
Metal soberbamente atmosférico e narrativo, que se perde num romanesco,
mitológico e principesco Folk Metal
de essência medieval. A sua sonoridade de inspiração Western remete-nos para um letárgico, esquecido e descorado deserto
– onde tenebrosas, opressivas e massivas nuvens vigiam e enlutam os céus, e uma
paisagem árida, inóspita e estéril, há muito órfã de esperança, adormece e
empalidece num imperturbável estádio de dissecação – que nos passeia num depressivo,
solitário e pensativo galope sem destino conhecido. Estes quatro cavaleiros ancestrais
de heresia hasteada e instrumentos empunhados perseguem-nos, respiram-nos e
atemorizam-nos do primeiro ao derradeiro tema. São cerca de 44 minutos inteiramente
saturados e governados por uma intensa soturnidade que nos mumifica e soterra num
profundo estado de prostração. Tombem as pálpebras, cerrem os maxilares, sacudam
a cabeça e inalem toda a nebulosidade tumular de ‘World’s Blood’ exalada
por duas guitarras lacrimosas que tanto se enfurecem em riffs corrosivos, intrigantes, tocantes e altivos, como se
tranquilizam em refinados e contemplativos acordes, um imponente e reverberante
baixo de linhas tingidas a impetuosidade, volume e expressividade, uma incansável
e retumbante bateria locomovida e esporeada a uma ritmicidade cavalgante, enlouquecedora
e ofegante, e ainda uma voz fervorosa, escarpada, irada e poderosa que ecoa pelos
longos desfiladeiros que canalizam toda a obscuridade que este álbum carrega e
ostenta. De salientar ainda a capa enigmática que com inteira precisão traduzira e espelhara para o universo visual tudo o que a lamentosa alma de ‘World’s Blood’ nos
segreda. Este é um álbum intensamente marcante que nos envolve e anoitece. Um
registo de natureza tirânica e intrusiva que certamente tomará de assalto as rédeas de quem
nele se abrigar.
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Parabéns pela resenha tão bem escrita e sensível. Disco realmente surpreendente para uma banda que até então nos tinha apresentado um black metal de qualidade, porém mais tradicional e folk. Tenho curtido muito esta nova linhagem do black metal e principalmente suas variações mais ambiciosas.
ResponderEliminarsaudações de um brasileiro bastante assustado, preocupado e triste
#elenao
luis h