terça-feira, 16 de março de 2021

Review: ⚡ Cheval Sombre - 'Time Waits for No One' (2021) ⚡

★★★★

De olhar embriagado, respiração congestionada, semblante boquiaberto e espírito intensamente petrificado. É nesta condição deixada pela ressaca que se seguira à digestão do novo trabalho de Cheval Sombre – nome artístico do poeta e compositor nova-iorquino Chris Porpora – que me encontro. Oficialmente lançado no final do passado mês de Fevereiro pela mão da companhia discográfica britânica Sonic Cathedral nos formatos físicos de CD e vinil (ambos, sem surpresa, já esgotados), este quimérico e inspirador ‘Time Waits for No One’ vem orvalhado, esbatido e aromatizado por um onírico, etéreo e morfínico Psychedelic Folk de formosura pastoral e catártica candura sessentista que nos desmaia as pálpebras, afaga a alma e massaja o cerebelo. A sua sonoridade enfeitiçante, ataráxica e deslumbrante mergulha o ouvinte num profundo estado zen que o climatiza, reconforta e eteriza do primeiro ao derradeiro tema. Leve e gentilmente sussurrado por nove arejadas, angelicais e fluídas baladas de composições originais, e ainda uma embrumada, doce e aveludada versão cover de “No Place to Fall” (tema originário do carismático músico norte-americano Townes Van Zandt) este nirvânico sonho acordado tem a capacidade de nos embaciar a lucidez e prostrar num febril estádio de embriaguez. A sua sonoridade fluída, frágil e relaxada – pincelada a pálida e imaculada luminescência – movimenta-se aérea e vagarosamente em compassos envolventes, repetitivos e minimalistas de padrões alucinógenos, meditativos e utopistas. Reféns de um mélico torpor que nos paralisa os membros e alcooliza os sentidos, somos cortejados e deslumbrados por uma profética voz de tez ecoante, espectral e magnetizante, uma guitarra trovadora de apetitosos, enternecedores e sedosos acordes graciosa e cuidadosamente dedilhados a irretocável beatitude, e ainda mágicos teclados que – com o seu imersivo e criativo experimentalismo de idioma alienígena – revestem os céus de ‘Time Waits for No One’ com um macio e nimboso manto cósmico. Este é um álbum verdadeiramente arrebatador. Um registo sereno e transcendente, detentor de uma edénica toxicidade que nos desmaia e recosta nos braços da ataraxia. Bronzeiem-se e canonizem-se na sagrada resplandecência tenuemente bafejada por um Sol bocejante, debruçado nas montanhas que recortam o inatingível firmamento de um sempiterno crepúsculo de Verão, e testemunhem toda a mística e ritualística essência de um mavioso, idílico e lustroso álbum lavrado e emoldurado a caprichosa ternura. Vai ser demasiado fácil reencontrar esta consumada obra de Cheval Sombre perfilada entre a listagem dos melhores trabalhos florescidos em 2021.

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