É ainda Ã
deriva na eterna vacuidade cósmica, de sentidos embaciados e sem conseguir vislumbrar
o caminho de regresso a casa, que escrevo estas apaixonadas palavras na
atordoante ressaca em mim deixada pelo impactante novo álbum do quarteto
norte-americano – fixado na cidade de Chicago, Illinois – REZN.
Batizado pelos astros de ‘Solace’ e lançado no passado dia 8 de Março
sob a forma de LP, CD e digital, este novo capÃtulo da admirável jornada
celestial que esta banda americana principiara em 2017 desancorou a minha
consciência da gravidade terrestre e içou-a para os mais profundos, recônditos e
insondáveis territórios do universo. Consequência de um renhido e enleante jogo
de forças travado entre um enfeitiçante, inflamante e umbroso Psychedelic
Doom de imersiva e ciclónica toxicidade que nos infesta, afogueia e
inquieta, e um onÃrico, absorvente e morfÃnico Shoegaze de reconfortante
e açucarada melancolia que nos embruma, abraça e inebria, ‘Solace’ é uma
inspiradora obra de efeito consolador que não deixará ninguém indiferente. Vagueando
e equilibrando-se numa ténue linha que separa a abrasiva euforia da gélida letargia,
a mÃstica, nocturna e camaleónica sonoridade de REZN perpetua no nosso
olhar petrificado toda uma imutável expressão sonhadora, massaja o nosso espÃrito integralmente deslumbrado por experienciar algo assim, e nos catapulta para a intimidade estelar
onde naufragamos do primeiro ao derradeiro tema que compõe toda esta maravilhosa
odisseia. Detentor de uma desarmante beleza cinematográfica, ‘Solace’ é
oxigenado por uma messiânica guitarra de obsessivos, magnetizantes, asfixiantes
e reflexivos riffs lentamente consumidos pela cáustica distorção, um baixo modorrento
de imponente, fibrosa, sombreada e poderosa reverberação, uma bateria explosiva
de batida altiva, relampejante, retumbante e incisiva, uns vocais etéreos de
pele melodiosa, ecoante, suavizante e espectral, exóticos teclados de mugidos
alienÃgenas, uma mÃstica flauta de sopros orientais, e ainda um saxofone soturno
que nos transporta para uma intrigante atmosfera film-noir de coração
desalentado e olhar impaciente, posto – através de uma envidraçada janela onde
escorrem lágrimas chuvosas – numa quieta rua engolida pela negrura da noite. A vistosa
pintura que confere rosto a este tocante registo de REZN aponta os seus
créditos de autor ao talentoso e inconfundÃvel ilustrador norte-americano AdamBurke / Nightjar Illustration. São 40 minutos de fogo e água, tempestade e
bonança, exaltação e sedação, céu e inferno. Um álbum verdadeiramente
transformador pelo qual vagueamos, sonâmbulos e destemidos, sempre receptivos
a tudo o que ele nos possa dizer e oferecer. Não vai ser nada fácil ou sequer
desejado regressar de ‘Solace’. Percam-se e encontrem-se no diluviano e ofuscante misticismo de um álbum de dimensão mastodôntica com vista panorâmica para as
estrelas.
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