Review: 💀 G.O.L.E.M. - 'Gathering of the Legendary Elephant Monsters' (2024) 💀

★★★★

Depois de uma estreia marcante (aqui trazida e explanada), o talentoso quinteto italiano GOLEM (acrónimo de Gravitational Objects of Light, Energy and Mysticism) regressa agora com o lançamento do seu muito aguardado segundo álbum intitulado ‘Gathering Of the Legendary Elephant Monsters’ e editado nos formatos LP, CD e digital pela mão do selo independente local Black Widow Records. Enraizada na pequena cidade nortenha de Piacenza, esta fascinante formação italiana faz de um pomposo, dramático, melódico e glorioso Progressive Rock de brilho vintage a sua estrela orientadora, construindo uma ponte temporal entre a tradição e a sofisticação, onde as influências comungadas em velhas lendas nacionais (como por exemplo Premiata Forneria Marconi, Banco del Mutuo Soccorso, Museo Rosenbach e Le Orme) e outras renomadas importadas de Inglaterra (tais como Deep Purple, Van Der Graaf Generator, King Crimson, Atomic Rooster, Gentle Giant e Emerson, Lake & Palmer) partilham o protagonismo com um fresco e arejado cunho de autor. Compartimentado em seis enfeitados, complexos e intrincados temas dirigidos a refinado tecnicismo, banhados a diáfana beatitude e condimentados pelo comovente sentimentalismo, ‘Gathering Of the Legendary Elephant Monsters’ é uma brilhante obra de composições romanescas, majestosas, vistosas e epopeicas que mantém os seus ouvintes atentos, fascinados e deleitados do primeiro ao derradeiro minuto. Um faustoso teatro superiormente musicado por diversos teclados (que remetem o ouvinte para um cruzamento entre Jon Lord (Deep Purple), Tony Pagliuca (Le Orme), Keith Emerson (Emerson, Lake & Palmer) e Flavio Premoli (Premiata Forneria Marconi) de bailados rodopiantes, litúrgicos e mirabolantes que se passeiam graciosamente pela cósmica nebulosidade de polposos, misteriosos e imponentes mugidos, um baixo corpulento de linhas sombreadas, elásticas e tonificadas, uma bateria expressiva de ritmos desatados, dinâmicos e animados, e uma liderante, emotiva e enfeitiçante voz de génio harmonioso, pomposo e apaixonante a fazer recordar Derek Shulman (principal vocalista de Gentle Giant). Este segundo álbum de GOLEM representa uma natural evolução (face ao seu já belíssimo álbum de estreia) aproximando a banda italiana da perfeição. Um registo verdadeiramente sublime de atmosfera celestial, onírica, mística e cerimonial que tanto amaina como revolve as águas da nossa espiritualidade e incendeia o nosso coração. Sintam-se levitar aos negros céus da eterna noite cósmica e gravitar numa perpétua dança orbital em torno deste titânico astro chamado GOLEM. Uma suculenta iguaria que satisfará o desejo de requinte de todos os amantes do género.

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Review: 🌵 Brant Bjork Trio - 'Once Upon a Time in the Desert' (2024) 🌵

★★★★

Contando vinte e cinco anos de uma frutífera carreira a solo (principiada em 1999 com o lançamento do bíblico ‘Jalamanta’), o carismático Brant Bjork (talentoso multi-instrumentista e ex-baterista dos históricos Kyuss e Fu Manchu) continua a colocar toda a sua motivação, dedicação e inspiração ao serviço da música que lhe corre nas veias, acrescentando agora mais um registo – indubitavelmente o meu favorito dos seus últimos largos anos – à sua já extensa discografia. Residente na paradisíaca cidade-resort de Palm Springs – cidade cultivada no coração do deserto californiano – há muito que o radical Brant Bjork surfa, incansavelmente, as douradas dunas do seu autoproclamado Low Desert Punk, e o novíssimo ‘Once Upon a Time in the Desert’ – lançado com o carimbo do seu selo discográfico de autor Duna Records (através dos formatos LP, CD e digital) – vem confirmar toda a vistosa, gloriosa e invejável forma que o já veterano músico ostenta na viragem do seu meio século de vida. Na agradável companhia do icónico baixista Mario Lalli (Yawning Man e Fatso Jetson) e de Ryan Güt na bateria (que ao longo dos últimos dez anos tem empunhado as suas baquetas em defesa do Low Desert Punk), o líder Brant Bjork forma, assim, este exótico, sólido e simbiótico power-trio de instrumentos apontados a um fogoso, apimentado, libidinoso e torneado Desert Rock bronzeado por um quente, alucinógeno e luzente Psychedelic Rock de doce aroma tropical, bailado por um provocante, colorido e serpenteante Funk de groove sensual, e pontapeado por um excitante, delirante e ritmado Punk Rock locomovido a baixa rotação. De pés desnudos, firmados nas finas, mornas e tisnadas areias do deserto, pele morena, beijada pelo cálido bafo solar e arejada por uma suave e temperada brisa que sobrevoa o infindável tapete arenoso, olhar mergulhado e naufragado nas profundezas luminosas e flamejantes de um Sol reinante, e espírito integralmente embevecido, experienciamos – à sagrada boleia da extasiante, imersiva e magnetizante música de ‘Once Upon a Time in the Desert’ – visões caleidoscópicas, ilusões, alucinações, grande sensibilidade sensorial, sinestesias, delírios místicos, flashbacks, alteração da noção temporal e espacial, confusão, desagregação do ego e o arrombamento das portas da percepção. A eucaristia sacramental do LSD na mística e ritualística vacuidade de um deserto que se espreguiça até onde a vista pode alcançar. Na composição desta contagiante, psicotrópica e apaixonante sonoridade – banhada em psicadélico exotismo – bamboleiam-se uma afrodisíaca guitarra Jimi Hendrix’eana de polposos, espessos, escorregadios e vaidosos riffs, e solos uivante, ácidos, embriagados e ziguezagueantes, um baixo obeso, gorduroso e coeso de linhas fibróticas, encaracoladas, onduladas e hipnóticas, uma bateria solta, leve e desinibida de ritmos verdadeiramente excitantes, fascinantes e esponjosos, e uma voz simpática, risonha, limpa e harmoniosa que coloca sobre as rodas de um skate todos os enleios instrumentais. Este é um álbum electrificado a vibração positiva – a banda-sonora perfeita para emoldurar um verão já findado – que transpira erotismo e respira boa disposição. Um disco tremendamente apetitoso, radioso, gracioso e viciante que nos encandeia, namora e prazenteia num arborizado e arejado oásis espiritual de carícia sensorial. 'Once Upon a Time in the Desert' é um musicado álbum de recordações conservadas e romantizadas pelo saudosismo. Uma sincera homenagem à adolescência irreverente de sonhos na proa. A frescura, a doçura e a formosura de mãos dadas e turbilhonadas numa estonteante espiral. Pura mescalina via auditiva. Crescem e florescem cactos no meu peito.

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Review: 🍂 Needlepoint - 'Remnants of Light' (2024) 🍂

★★★★

Depois de sorvido o açucarado rebuçado de aroma primaveril que é ‘Walking Up That Valley’ (lançado na madrugada de 2021 e aqui imoderadamente reverenciado), agasalho-me, agora, confortável e prazerosamente, na sua sucessora (e preclara) obra de ambiência outonal ‘Remnants of Light’, tricotada pela apaixonante Needlepoint (banda composta por quatro talentosos músicos noruegueses com residência na capital Oslo). Carimbado pela companhia discográfica caseira BJK Music (editora gerida por Bjørn Klakegg – um dos integrantes da banda – cujo catálogo ostenta toda a já respeitável discografia de Needlepoint) e desaguado nos nossos ouvidos através dos formatos LP, CD e digital, este sétimo trabalho da formação escandinava é climatizado por uma doce fragância onde se alcoolizam, reconfortam e harmonizam um ensolarado, ritmado e caleidoscópico Psychedelic Pop de estilo barroco, um melodioso, meloso e elegante Prog Rock de aristocrático sotaque Canterbury’esco e um arejado, delicado e rural Folk de ornamentada moldura outonal. A sua sonoridade carinhosa, gentil e sedosa – condimentada a relaxante delicadeza, deífica beleza e imaculada simplicidade – embriaga, afaga e mitiga o ouvinte com uma caramelizada lisergia que o mergulha nas profundezas esponjosas da introspecção. Banhada em influências como Genesis, YES, Caravan, Camel, Donovan, Nick Drake, Mark Fry e Vashti Bunyan, a afável música de Needlepoint pavimenta o imaginário de quem os comunga com extensas planícies nevadas – repletas de moribundas folhas acastanhadas, sobrevoadas por pássaros de canto afinado e vigiadas de perto por melancólicos céus acinzentados – que se desdobram até onde a vista pode alcançar. Composto por nove canções irmãs que partilham uma brancura curativa, uma frescura odorosa, uma ternura lenitiva e uma formosura aventurosa que nos rebaixam as pálpebras, florescem o sorriso e aquecem as maçãs do rosto, ‘Remnants of Light’ é um álbum sumamente sublime. Uma obra divinal que coloca a nu toda a nossa permeabilidade emocional. Baloicem vagarosamente as vossas cabeças à enfeitiçante boleia de uma trovadora guitarra que desata detalhados, floridos e miraculosos acordes, um sumptuoso teclado de teclas coloridas, perfumadas e saltitantes, um baixo gingão de linhas bailantes, conexas e magnetizantes, uma bateria deliciosamente jazzy de tambores galopantes e pratos tilintantes, e uma veludosa, afectuosa e galante voz que nos sussurra ao ouvido fascinantes histórias que engordam os nossos sonhos. ‘Remnants of Light’ é a banda-sonora perfeita para musicar dias sombrios, frios e chorosos. Um calmante natural que nos amolece e embevece do primeiro ao derradeiro minuto.

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sexta-feira, 11 de outubro de 2024

Review: ☄️ The Verge - 'The Verge' (2024) ☄️

★★★★

É ainda de lucidez levemente atordoada e alma pesadamente embevecida que escrevo estas palavras acordadas, recém-surgidas à tona da perdurável ressaca que se seguira às múltiplas audições que eu dedicara a este impactante álbum de estreia do talentoso quarteto norueguês The Verge. Licenciados no ensino superior da música Jazz, estes irreverentes “Jazz Cats” naturais da cidade de Oslo começaram a dar os seus primeiros concertos locais em 2019 e em 2021 gravaram o seu homónimo registo de estreia que só no presente ano veria, finalmente, a luz do dia, descortinado pela jovem companhia discográfica norueguesa Is it Jazz? Records (filha da conceituada Karisma Records e especializada nos diversos sub-géneros da música Jazz) sob a forma de LP, CD e digital. Fruto suculento de uma exótica árvore repleta de enxertos sonoros, ‘The Verge’ mostra-se orgulhosamente ao mundo sob a forma de um deslumbrante puzzle musical, de incitamento e excitamento mentais, onde um sensacional, excêntrico, magnético e cerebral Jazz Rock de aventurosas aterragens no electrizante território do Jazz Fusion e aparatosas despistagens no escorregadio pavimento do Avant-garde Jazz, um hipnótico, taciturno, nocturno e melancólico Contemporary Jazz de imersiva e contemplativa beleza cinematográfica, e um matemático, sinuoso, oleoso e enfático Prog Rock de esdrúxulo e dramático sotaque Zeuhl’esco se prendem e desprendem numa enfeitiçante e apaixonante dança gravitacional. Combinando a paródia circense do célebre Frank Zappa, a cerimonial dissonância dos franceses Magma, a reflexiva bonança do dinamarquês Jakob Bro e os psicotrópicos remoinhos dos britânicos Soft Machine, a eloquente, viva e multifacetada sonoridade de The Verge passeia-se envaidecidamente por ambientes desiguais que nos lapidifica, terrifica e aprisiona num claustrofóbico labirinto sem porta de saída, anoitece, inebria e mergulha nas profundezas abissais da doce melancolia, e estremece, embala e ensurdece na sónica vertigem de um alucinante vórtice. Um verdadeiro safari jazzístico – norteado por um virtuosismo supremo, climatizado por uma constante alternância entre a tormenta e a tranquilidade, e condimentado por um experimentalismo sem fronteiras – que nos viaja sem cinto de segurança. Nas fileiras desta criativa orquestra de apenas quatro músicos, dialogam – numa petrificante simbiose – uma infatigável, enérgica e intratável bateria em polvorosa que se desvaria em espalhafatosas acrobacias e desdobra em furiosas e fogosas investidas, uma estética guitarra de atmosféricos acordes que nos roubam o ar do peito e solos ciclónicos que nos rodopiam e naufragam, um baixo elástico de linhas polposas, bailantes, magnetizantes e libidinosas, um saxofone esquizofrénico que tanto se perde num louco turbilhão de berrante e gritante histerismo, como se encontra numa sedosa e calmosa elegia de uivos lunares, e uma flauta de sopros odorosos, serpenteantes e veludosos que anuncia o efémero término do estado de emergência em que este álbum reside. ‘The Verge’ é um disco imensamente elaborado, inspirado e cativante que não dará descanso às glândulas salivares dos indefectíveis aficionados do expansível universo da música Jazz. Uma obra inteiramente pensada, arquitectada e esculpida à minha imagem. Sempre que me embrulho e divago nos seus meandros, tudo em mim suspira que se trata mesmo do meu álbum favorito deste ano (dos lançados até ao momento que não escaparam ao olhar atento do meu radar), e o acumular de renovadas audições só incrementa o transbordante fascínio a ele dedicado.

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