Review: 🐺 André Drage - 'Wolves' (2025, Drage Records) 🐺

★★★★

Proveniente da insuspeita Noruega – aquele que é, aos meus olhos, o mais importante e populoso viveiro do Jazz Fusion em território europeu – dá à costa este espantoso registo que inundara de inefável prazer o meu cérebro, arregalara os meus olhos, fizera salivar os meus ouvidos e massajara todas as zonas erógenas do meu corpo. Formado e liderado pelo versátil e talentoso baterista, produtor e compositor norueguês André Drage (integrante da banda Draken), este engenhoso, irreverente e aparatoso quinteto natural da cidade-capital Oslo irriga o assombroso ‘Wolves’ com um enfeitiçante, inventivo, imersivo e provocante Jazz Fusion de extravagante caligrafia Avant-garde’esca e uma doce fragância oriental, em simbiótica, fascinante e ritualística comunhão com um agradável, lustroso, luxuoso e dançável Prog Rock de ameno clima Canterbury’esco. Lançado nos formatos LP e digital sob o exclusivo carimbo editorial de autor (via Drage Records), este criativo colectivo – de alma vendida aos místicos desígnios da música Jazz – partilha a genética de influentes referências locais da contemporaneidade como Bushman’s Revenge, Needlepoint, Soft Ffog, The Verge, Krokofant, Sex Magick Wizards, Elephant9, Jordsjø, Wobbler, WIZRD, e Kanaan, assim como comunga o precioso legado deixado por grandiosas lendas internacionais como King Crimson, Mahavishnu Orchestra, Soft Machine, Nucleus, Return to Forever, Herbie Hancock, The Eleventh House feat. Larry Coryell, Frank Zappa, Colosseum, Weather Report, Brand X, Caravan, National Health e Jean-Luc Ponty. Arquitectado por impressionantes, vibrantes, audaciosas e desafiantes composições – brilhantemente executadas a estimulante, requintada, cuidada e estonteante perícia – ‘Wolves’ caça-nos, enterra os seus longos e afiados caninos na nossa jugular e conquista-nos sem qualquer resistência da nossa parte. A sua sonoridade imensamente sedutora, esfíngica, mística e cativante viaja-nos, alucinados e sem travões, pelas curvas e contracurvas do seu corpo oleoso, sinuoso e invertebrado, desaguando-nos, desmaiados, absortos e deslumbrados, nas suas paradisíacas praias virginais de luzência deífica. A frenética euforia e a anestésica melancolia de mãos dadas. Nas asas de uma bateria bombástica, excêntrica e inflamante que se aventura e desventura em excitantes, extraordinárias, propulsivas e mirabolantes acrobacias, uma guitarra exótica, ciclónica e esdrúxula que se hasteia em angulosos, dramáticos, enfáticos e faustosos riffs e se meneia em solos intrincados, ziguezagueantes, vertiginosos e desvairados, um baixo elástico, esponjoso, gorduroso e hipnótico de linhas carregadas, pulsantes, bailantes e carnudas, um teclado sonhador que desata frescas, aromáticas, seráficas e romanescas harmonias, e um buliçoso, histérico e ostentoso violino de aura fabular e mugidos penetrantes, fugidios, luzidios e arrepiantes, percorremos as perfumadas, arejadas, verdejantes e encantadas planícies fantasiadas e realizadas por André Drage. Todo um utópico, extasiante, psicadélico e caleidoscópico delírio que durante 35 minutos nos aspira e centrifuga na sua profunda garganta rodopiante, e depois nos cospe, embriagados, entontecidos e desnorteados, para a cadeira da estranha e desconfortável realidade. Sumamente, este é um álbum verdadeiramente belo e viciante que extravasa as fronteiras da perfeição. Uma obra-prima notável onde o virtuosismo técnico é posto ao serviço da música e não o oposto. Em ‘Wolves’ nada há de censurável e tudo há de venerável. Vai ser fácil vê-lo digladiar-se pelo mais cobiçado lugar do pódio onde figurarão os melhores registos de longa duração do presente ano.

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quarta-feira, 2 de abril de 2025

Review: 🔥 Desert Smoke - 'Desert Smoke' (2025, Raging Planet) 🔥

★★★★

Depois do EP de estreia ‘Hidden Mirage’ (lançado em 2018 e aqui explanado) e do álbum ‘Karakum’ (lançado em 2019 e aqui analisado), os druidas desérticos Desert Smoke estão finalmente de regresso com o nascimento do seu muito aguardado novo trabalho de longa duração – de denominação homónima e com a edição a cargo do insuspeito selo discográfico português Raging Planet através dos formatos LP, CD e digital – e, devo antecipar, que se trata do meu registo favorito destes cosmonautas portugueses. Incensada por um intoxicante, místico, atmosférico e electrizante Heavy Psych que se agiganta, encrespa e obscurece num montanhoso, belicoso, imponente e contagioso Psychedelic Doom, a esfíngica, cerimonial e camaleónica sonoridade de ‘Desert Smoke’ é farolizada pela simbiose instrumental, lavrada por uma extravagante caligrafia árabe e perfumada por uma doce fragância oriental. As suas absorventes, criativas, intuitivas e incandescentes jams que evoluem de estados contemplativos, letárgicos e reflexivos – banhados a deífica, plácida e seráfica beatitude – para explosivas, agressivas e orgásmicas erupções de incontida e diluviana adrenalina, tanto embrumam o ouvinte numa açucarada anestesia, como o estremecem e enlouquecem de sísmica e vulcânica euforia. Governado por atmosferas virulentas, sulfurosas, arenosas e fumarentas que se adensam num mistério tentador, somos engolidos e cativados do primeiro ao derradeiro tema. São 35 minutos com vista panorâmica e desabrigada para a eterna noite sideral. Desancorados da gravidade terrestre e mergulhados nas profundezas abissais do infindável oceano cósmico, somos embalados na sónica vertigem de Desert Smoke, trespassando quasares, montando cometas e driblando massivos astros solitários. Toda uma fantástica odisseia intergaláctica superiormente musicada por duas guitarras sultanas – dominadas pela rugosidade e fogosidade do efeito Fuzz – que se entrançam na condução de ciclónicos, enfeitiçantes e catatónicos riffs, e destrançam num inesgotável manancial de solos ácidos, alucinados e esvoaçantes, um baixo hipnótico de linhas carnudas, sisudas e dançantes, e uma bateria estimulante que – com a robótica precisão de um relógio suíço – tiquetaqueia com total perseverança a tempestade e a bonança. Este é um álbum piramidal – de natureza celestial, consagração sensorial e dilatação consciencial – que tanto nos inebria, amolece e extasia com as suas edénicas paisagens introspectivas, como aspira, centrifuga e sobreaquece com os seus inflamados e selváticos remoinhos. Aventurem-se e desventurem-se nesta impactante, febril e viciante alucinação que varre todo o Cosmos, distorce as coordenadas do espaço-tempo e resvala nas costuras fronteiriças da perfeição.

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