Depois de em
2020 ter ficado de queixo completamente caído ao deparar-me com o brilhante e
irretocável álbum de estreia dos texanos White Dog (aqui
devidamente escalpelizado e, mais tarde, aqui naturalmente premiado como um dos melhores
registos nascidos nesse mesmo ano), regresso agora com renovadas palavras
elogiosas destinadas ao seu tão aguardado sucessor, denominado ‘Double Dare
Dog’ e captado de forma inteiramente analógica, que acaba de sair à rua pela
insuspeita mão do influente selo londrino Rise Above Records através dos
formatos físicos LP e CD. Com uma formação transfigurada (a substituição de
vocalista e o acréscimo de um teclista) mas mantendo a sua roupagem clássica, o
agora sexteto, enraizado na grande cidade de Austin (capital do estado
norte-americano do Texas), continua a trilhar a sua gloriosa jornada
musical com a bússola apontada ao dourado território setentista. Numa agradável,
relaxada, ensolarada e adorável viagem – debaixo de uma intensa e amarelecida luzência
vintage – que atravessa as deslumbrantes paisagens rurais de um apimentado,
ritmado, invertebrado e afrodisíaco Blues Rock de condimentado sabor Tex-Mex,
um empolgante, tórrido, suado e dançante Southern Rock de vaidade
sulista, e ainda de um musculoso, fogoso, lustroso e torneado Hard Rock sarapintado
por vibrantes colorações de um caleidoscópico psicadelismo californiano, ‘Double
Dare Dog’ passeia o ouvinte – de texanas calçadas, pernas cruzadas, chapéu
de aba larga reclinado na cabeça e um palito mordiscado na boca – pelas
verdejantes pastagens que se desdobram até onde a vista pode alcançar, ajardinando
toda uma nostálgica época há muito enterrada pelas areias do tempo. Homenageando
os autóctones ZZ Top e bebendo influências de outras bandas carismáticas
como Lynyrd Skynyrd, The Allman Brothers Band, Creedence
Clearwater Revival, The Marshall Tucker Band, James Gang, The
Outlaws, Quicksilver Messenger Service e Grateful Dead, assim
como direccionando os holofotes para outras mais obscuras como Highway (Minnesota,
EUA), Lightning (Minneapolis, EUA) e os canadianos Aaron Space, a
quente, swingada, atraente e atrevida sonoridade de White Dog é
como que uma fresca brisa de aroma oceânico que perfuma e aviva o ar seco e soalheiro
do deserto. De olhar enternecido, sorriso desabrochado e espírito embevecido, embalamos
à apaixonante, idílica e contagiante boleia de duas guitarras siamesas que
florescem harmoniosos, veneráveis e cheirosos acordes de onde serpenteiam requintados,
estonteantes e rendilhados solos, um baixo gingão de bafo pulsante, magnetizante
e palpável, um carismático teclado Hammond bailado a polposos, melódicos
e sumptuosos mugidos, uma afável bateria de sensibilidade jazzística, galopada, sem esporas, a um ritmo leve, solto e descontraído, e uma voz polida, aveludada e felina. A bonita arte gráfica que confere rosto a esta viciante iguaria texana tem como seu autor o talentoso ilustrador local Taylor W. Rushing. ‘Double
Dog Dare’ é um western soberbamente musicado. Um registo tremendamente
irresistível, pensado e executado à minha imagem, que decerto não dará descanso
aos demais concorrentes pela acesa luta ao título de melhor álbum do ano. Entrem,
ousados, neste poeirento e barulhento saloon com forte odor a pólvora – de
coldre desapertado, dedo indicador repousado no gatilho e debaixo de olhares desconfiados
que se erguem acima dos ombros – e beberiquem este mélico bourbon. Cinco cintilantes
estrelas para estes temidos pistoleiros de fama firmada e disseminada por todo
o tapete arenoso do velho oeste. Depois de dois disparos certeiros no meu
coração, já salivo pelo terceiro.
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