Esta seria a
minha quinta experiência de Colour Haze ao vivo, mas tudo em mim se
comportava como se da primeira vez tratasse. O histórico e remodelado quarteto
germânico (depois do baixo ter trocado de mãos) estava de visita a Portugal
pela terceira vez (todas elas com o carimbo da promotora Garboyl Lives),
e a presente ocasião era essencialmente motivada pela apresentação da sua
recentíssima obra ‘Sacred’ (aqui devidamente aclamada). E foi
justamente com esse seu 14º álbum de estúdio que a banda principiara uma
arrebatadora performance que nos rebaixaria as pálpebras, esculpiria o sorriso
no rosto, baloiçaria o corpo e inundaria as zonas mais erógenas do nosso
cérebro durante 120 minutos. Embalado num deleitoso, arejado, condimentado e majestoso
Psychedelic Rock com vista para a colorida aurora boreal, e num pomposo, ondulante,
glorioso e levitante Progressive Rock de aura espacial, o público – que
acorrera em grande número à sala 2 do Hard Club (na cidade do Porto) – conquistado
aos primeiros acordes, alcançava o tão almejado nirvana. De sentidos incensados
por uma doce embriaguez, serpenteámos os nossos corpos à irresistível e
ofuscante boleia da sumptuosa guitarra – superiormente manejada pelo virtuoso Stefan
Koglek, esse encantador de plateias – que florescia delicados, precisos e refinados
acordes de tonalidade quente, amarelecida e aveludada, da expressiva, audaz e
incisiva bateria – domesticada de forma irrepreensível pelo notável Manfred
Merwald – que nos brindara e empolgara com admiráveis acrobacias jazzísticas
por entre o fogoso e esplendoroso brilho dos pratos e o aparatoso e rumoroso
galope tribalístico dos timbalões, um pulsante, sombreado e diligente baixo de
linhas desenhadas a negrito – firmemente empunhado pelo novato da banda Mario
Oberpucher – que sublinhava e escoltava de perto todas as evasões da
guitarra, dos oníricos teclados – caprichosamente magicados pelo Jan
Faszbender – que nos borrifavam de poeira estelar com os seus polposos
mugidos e ventos cósmicos, e da voz sóbria, melódica e profética – entoada pelo
trovador Stefan Koglek – que passeava pelas avenidas ajardinadas da
edénica, estética e melíflua musicalidade de Colour Haze. Fora do palco
vivia-se um imperturbável estádio de transe espiritual, transversal a todos os
seus discípulos ali presentes, e temas como “Aquamaria”, “Skydancer”,
“The Real” e “Transformation” recebiam da plateia as mais
extravagantes e entusiastas reacções. Nas costas da banda centrifugavam-se
imersivas e labirínticas projecções visuais de caleidoscópica pirotecnia explodida
a texturas psicadélicas que nos afunilavam numa extasiante e inescapável
hipnose. Os ponteiros do relógio corriam a passo largo e ninguém dava por isso.
O foco e o fascínio eram totais na admirável alquimia que os Colour Haze
cozinhavam em palco, e foi com moderado desgosto que vimos a banda saudar o
público e virar costas a este (moderado, pois, a julgar pela brevidade da
tímida despedida, já se adivinhava um encore com o seu inevitável hino “Love”).
E assim foi. Nem dois passos os alemães deram fora do palco que logo regressaram ao sítio onde haviam sido tão felizes durante hora e meia, para
serem novamente soterrados numa monolítica avalanche de ruidosos aplausos e encorajantes clamores.
Assim que a palheta embatera nas grossas cordas do baixo, depressa se
reconheceu o tema que se seguia: “Tempel”. De cabeças rodopiantes,
corpos vacilantes e acalorados por um transbordante estado de destravada excitação,
vagueamos pelos diferentes climas desse apaixonante tema, para logo de seguida
os nossos corações amolecerem ao tão ansiado som da mélica e comovente “Love”
a encerrar uma performance verdadeiramente epopeica. Debaixo dos ensurdecedores
aplausos, o Stefan Koglek selara a promessa de um regresso a Portugal já
no próximo ano, o que catapultara o mercúrio para o píncaro do termómetro que media
a escala da nossa satisfação. Não foi fácil aceitar que o concerto havia terminado
e digerir o desconfortável silêncio que se seguira, deixando a nu o quão
rendidos e embriagados estávamos. Colour Haze tem esse dom. Subimos aos
céus e por lá ficámos.
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