segunda-feira, 31 de agosto de 2020

🎬 2/3 (2020)

Wild Wild Country S01 (2018) de Maclain Way & Chapman Way   ★★★★★
The Jinx: The Life and Deaths of Robert Durst S01 (2015) de Andrew Jarecki   ★★★★★
Call Me By Your Name (2017) de Luca Guadagnino   ★★★★
Predestination (2014) de The Spierig Brothers   ★★★★
After Life S01 (2019) de Ricky Gervais   ★★★★★
After Life S02 (2020) de Ricky Gervais   ★★★★★
Broken Lance (1954) de Edward Dmytryk   ★★★★
Have a Good Trip: Adventures in Psychedelics (2020) de Donick Cary   ★★★★
The Law and Jake Wade (1958) de John Sturges   ★★★★
Sergeant Rutledge (1960) de John Ford   ★★★
The Train Robbers (1973) de Burt Kennedy   ★★★★
13th (2016) de Ava DuVernay   ★★★★★
Il Mercenario (1968) de Sergio Corbucci   ★★★★
Cosmos: Possible Worlds S01 (2020) de Ann Druyan & Brannon Braga   ★★★★★
The Babushkas of Chernobyl (2015) de Anne Bogart & Holly Morris   ★★★★
Minnesota Clay (1964) de Sergio Corbucci   ★★★☆☆
Endgame 2050 (2020) de Sofia Pineda Ochoa   ★★★★★
This Is Us S01 (2016/2017) de Dan Fogelman   ★★★★★
Two-Lane Blacktop (1971) de Monte Hellman   ★★★☆☆
Inception (2010) de Christopher Nolan   ★★★★★
The Getaway (1972) de Sam Peckinpah   ★★★★
Dirty Harry (1971) de Don Siegel   ★★★★
Saving Private Ryan (1998) de Steven Spielberg   ★★★★★
Hunting for Hedonia (2019) de Pernille Rose Grønkjær   ★★★★
The Gunfighter (1950) de Henry King   ★★★★
The Matrix Reloaded (2003) de The Wachowski Brothers   ★★★☆☆
Mystic River (2003) de Clint Eastwood   ★★★★
Fahrenheit 11/09 (2018) de Michael Moore   ★★★★
Per Un Pugno di Dollari (1964) de Sergio Leone   ★★★★
Blue Valentine (2010) de Derek Cianfrance   ★★★★
This Is Us S02 (2017/2018) de Dan Fogelman   ★★★★★
Once Upon a Time in America (1984) de Sergio Leone   ★★★★★
Tom Horn (1980) de William Wiard   ★★★☆☆
Garden of Evil (1954) de Henry Hathaway   ★★★★
The Godfather (1972) de Francis Ford Coppola   ★★★★★
The Godfather: Part II (1974) de Francis Ford Coppola   ★★★★★

Review: ⚡ Turtle Skull - 'Monoliths' (2020) ⚡

Da cidade costeira de Sydney (situada na Austrália) chega-nos a sublime fragância fabulosamente suspirada por um dos álbuns – por mim – mais aguardados do corrente ano. ‘Monoliths’ é segundo trabalho de longa duração do adorável quinteto Turtle Skull que acaba de ser lançado hoje mesmo tanto em formato digital como nos formatos físicos de CD e vinil através da parceria discográfica que coliga o selo germânico Kozmik Artifactz ao australiano Art As Catharsis. E se a ele dedicava toda uma atestada expectativa, é justo começar por antecipar que o mesmo não só a preenchera na totalidade como até extravasara as suas longínquas costuras. Fundamentada num mântrico, celestial, estival e messiânico Psychedelic Rock de reminiscências revivalistas e ambiências fantasistas, que tanto se nebuliza e eteriza num deslumbrante, lenitivo, contemplativo e extasiante Krautrock de imediata imersão e inesgotável fascinação, como se obscurece e enrijece num poderoso, chamejante, electrizante e vigoroso Heavy Psych de ameaçadoras feições Doom’escas e encrostado a efervescente efeito Fuzz, esta miraculosa obra tivera em mim um irreparável impacto sensorial que me escancarara as portas da percepção e catapultara para um mergulho nas profundezas da introspecção. Aprisionados num perpétuo baloiçar gravitacional que nos ricocheteia entre a doce e letárgica melancolia e a sedada e emancipadora euforia, somos seduzidos, abraçados e oxigenados pela mágica, quimérica e embriagada nebulosidade sulfatada por Turtle Skull. Autoapelidada de “Flower Doom”, a estética, profética e enfeitiçante sonoridade de ‘Monoliths’ desabrocha um forte contraste entre o pesado negrume e a leve luzência que convida o ouvinte a experienciar toda uma panóplia de climas, aromas e sentimentos desiguais. De olhar petrificado, pálpebras tombadas, sorriso imortalizado no rosto, espírito maravilhado e cabeça vagarosamente balanceada de ombro em ombro, embarcamos numa consagrada peregrinação pelas mais erógenas zonas do nosso Cosmos cerebral à catártica boleia de um translúcido, ensolarado, evangélico e imaculado coro vocal de afago espiritual, uma afrodisíaca guitarra de paladar oceânico que se envaidece em serpenteantes, magnéticos e ofuscantes Riffs de textura arábica, e rubrica ácidos, extravagantes e delirados solos de elevada toxicidade, um baixo modorrento de ondeantes, fluídas e murmurantes linhas a capitanear uma diluviana reverberação, um intrigante sintetizador que ausculta o misticismo segredado pelo espaço sideral, e ainda uma hipnótica bateria que – de forma comprometida, airosa e absorvida – tiquetaqueia toda esta reflexiva, inventiva e transformadora odisseia mental capaz de nos pacificar os sentidos e massajar a alma sedenta de algo assim. De espalhar ainda elogiosas apreciações ao caprichoso artwork de créditos apontados ao artista local Davey Fenn que tão bem transportara para o domínio visual todo o ataráxico misticismo destilado pelo colectivo australiano. ‘Monoliths’ é um sumarento néctar de propriedades nirvânicas que em mim provocara uma abundante salivação. Um registo de beleza consumada que vive da sensibilidade. Degustem esta deliciosa, encantadora e copiosa secreção de interiorização auditiva e vivenciem de forma compenetrada, estarrecida e reverenciada um dos álbuns mais edénicos dos últimos anos. Não vai ser nada fácil despertar deste lúcido sonho superiormente musicado pelos druidas Turtle Skull e dar à costa da lucidez que nos fora subtraída e sonegada do primeiro ao derradeiro minuto. O Paraíso aqui tão perto, à distância de uma audição. Banhem-se e regozijem-se neste tangível oásis espiritual.

Links:
 Facebook
 Bandcamp

Review: ⚡ Fogteeth - 'Lowlife Blues & Fuzzed Up Grooves' EP (2020) ⚡

Oriundo do sul da Finlândia – mais concretamente da invernosa cidade de Lahti – chega-nos o portentoso EP de estreia forjado pelo power-trio instrumental Fogteeth. Intitulado de ‘Lowlife Blues & Fuzzed Up Grooves’ e lançado sob o exclusivo formato digital através da sua página de Bandcamp oficial, este registo de curta duração, mas prolongada fascinação, vem inundado e assombrado por um musguento, lamacento e psicotrópico pântano de onde sobressai um narcotizante, obscuro, nebuloso e intrigante Heavy Blues emporcalhado por um abrasivo, denso, tenso e combativo Sludge, e fibrado por um fumarento, vagaroso, ocioso e corpulento Stoner Doom de elevada toxicidade. A sua sonoridade de compleição vulcânica, oleosa, rugosa e titânica – intumescida pelo incandescente, espinhoso e erodente efeito Fuzz – agiganta-se num mastodôntico tsunami estriado de morfina que atropela todo aquele que no seu caminho estacionar. São 22 minutos integralmente oxigenados por uma lisérgica, ácida e luciférica misantropia de tons esverdeados que nos desmaia as pálpebras, dilata as narinas e recosta o semblante sobre o peito. Uma penetrante, impiedosa e magnetizante narcose onde nos embrenhamos e naufragamos, sulfatada por uma liderante guitarra de imponentes, trevosos, resinosos e influentes Riffs de onde são vertidos e conduzidos serpenteantes, lustrosos, esponjosos e vagueantes solos, um hipnótico baixo reverberado a linhas ondeantes, expressivas, inventivas e bafejantes, e uma galopante bateria locomovida a explosiva ressonância e incisiva luminância. Deixem-se eclipsar e embriagar pela negra ardência baforada pelo tridente nórdico, e vivenciem de lucidez atordoada e espírito petrificado toda esta imersão num abissal estádio de imperturbável sedação que vos massajará e eterizará membros e sentidos. Não vai ser fácil – ou sequer desejado – despertar, emergir e regressar das turvas águas de ‘Lowlife Blues & Fuzzed Up Grooves’, e dissipar toda esta cerrada neblina que nos gravitara, mordera e enfeitiçara do primeiro ao derradeiro tema.

Links:
 Facebook
 Bandcamp

Review: ⚡ Electric Moon - 'Live at Freak Valley Festival 2019' (2020) ⚡

Situados no estranho contexto em que o universo artístico ainda se tenta recompor do tremendo abalo epidémico que o derrubara, enfraquecera e pontapeara para bem longe dos palcos, poder assistir – ainda que de forma não presencial – a registos ao vivo equivale a experienciar chuva no deserto. E se há bandas que nesse campo (o da passagem da alquimia ao vivo acima de palco para o formato físico e/ou digital) se podem adjectivar como irrepreensíveis, uma delas é seguramente Electric Moon. Originalmente captado no conceituado festival germânico em 2019 pela mão do popular programa televisivo alemão Rockpalast e com o seu lançamento integral e oficial agendado para o início do próximo mês de Setembro através da insuspeita Sulatron Records na forma física de CD (limitado a apenas 500 cópias disponíveis), ‘Live at Freak Valley Festival 2019’ é um álbum que conserva toda a purificante, edénica e atordoante magia do que é comungar ao vivo a liturgia cósmica deste profético power-trio que desde a sua fundação aponta os respectivos instrumentos ao lado eclipsado da Lua e por lá naufragam com inteira liberdade criativa. Absorvidos e revolvidos pelas suas construtivas, enfeitiçantes, deslumbrantes e evolutivas jam’s de longa duração e imperturbável fascinação que afunilam e canalizam o ouvinte numa labiríntica hipnose oxigenada a saturada narcose, Electric Moon combina ingredientes como um lenitivo, hipnótico e imersivo Krautrock, um colorido, alucinógeno e embevecido Psychedelic Rock, um vagueante, exótico e extasiante Acid Rock, e ainda um mirífico, viajante e ritualístico Space Rock numa só receita capaz de nos desancorar da gravidade terrena e fazer transcender aos mais longínquos e recônditos lugares do espaço alienígena. Motorizado por uma alucinada, intoxicante e embriagada sonoridade condimentada a um livre, sónico e espontâneo experimentalismo sem fronteiras que o inibam, ‘Live at Freak Valley 2019’ tem o raro dom de nos suster a respiração, dilatar as pupilas e içar na vertiginosa direcção das abissais profundezas do oceano cósmico. Esta fantástica expedição estelar é brilhantemente liderada por uma esdrúxula guitarra que se perde e encontra por entre solos estonteantes, ácidos, arrebatados e ecoantes, um envolvente baixo que – sem nunca esquecer o Riff-base de cada tema – nos murmura linhas pulsantes, sombreadas, fibradas e ondeantes, uma estimulante bateria de ritmicidade tiquetaqueada a um galope constante, e ainda toda uma inimaginável e inesgotável profusão de venenosos efeitos que nos ofuscam a lucidez, amortalham numa densa nebulosidade sideral e atestam de embriaguez. De destacar ainda o inspirado, sublime e detalhado artwork de grandiosa devoção Budista com os devidos créditos dirigidos à Bookesia Estudio, e ainda da surpreendente inclusão de um derradeiro tema bónus temperado a um outonal, fabular, idílico e espiritual Folk de essência puramente acústica que encerra na perfeição toda esta revitalizante passeata pelos jardins astrais. Deixem-se diluir, seduzir e efervescer na nirvânica eucaristia de Electric Moon, e embarquem num profundo estádio de sonambulismo à boleia deste vívido sonho superiormente formulado e desdobrado por estes três astronautas germânicos que há muito tocam e mapeiam as mais erógenas zonas do nosso Cosmos interior.

Links:
 Facebook
 Bandcamp
 Sulatron Records

Review: ⚡ Ball - 'Like You Are… I Once Was… Like I Am - You Will Never Be' (2020) ⚡

Em 2017 redigia apaixonadas palavras ao impactante álbum de estreia do irreverente power-trio de origem nórdica Ball (review aqui), e hoje – imensamente deslumbrado e embriagado com a luciférica nasalação do fantástico registo que o sucede – sinto-me forçado a replicar toda a minha desmoderada devoção apontada a esta sui generis formação sediada na cidade-capital sueca de Estocolmo. Lançado muito recentemente pela mão da parceria discográfica local entre a Horny Records e a Subliminal Sounds nos formatos físicos de CD e vinil (este último ultra-limitado à prensagem de apenas 300 exemplares disponíveis para venda), ‘Like You Are…I Once Was…Like I Am – You Will Never Be’ ostenta um bélico, vigoroso, gorduroso e diabólico Hard Rock de roupagem vintage, ensopado num efervescente, enérgico, vulcânico e erodente Heavy Psych de bruma psicotrópica, e atemorizado por um ritualístico, enfeitiçante, horripilante e enigmático Proto-Metal de galope revivalista e adoração ocultista. A sua sonoridade fumegante, acrimónia e narcotizante – regada a diluviana lava incandescente, e emporcalhada pelo borbulhante, abrasado e intoxicante efeito Fuzz – é motorizada e carburada por uma guitarra pagã que se manifesta em afrodisíacos, imperiosos, majestosos e monolíticos Riffs Iommi’escos de onde trepam serpenteantes, ácidos, alcoolizados e esvoaçantes solos, um bafejante baixo de possante, densa, tensa e ondulante reverberação, uma bateria combativa de picante, enfática, dinâmica e rutilante ritmicidade, e ainda decrépitos vocais de expressão depravada, cavernosa, oleosa e eriçada que lidera com distinção toda esta vampírica liturgia. Deixem-se dissolver, consumir e revolver nas labaredas infernais de Ball e vivenciem de forma detida e vivida este seu tão ansiado regresso. Não vai ser fácil escoar toda a sedada euforia que nos atestara e esporeara do primeiro ao último minuto. Escaldem-se e profanem-se neste sarcófago em constante ebulição, e banhem-se no violento negrume que o assombra. Um dos meus registos favoritos do presente ano está aqui: na demoníaca combustão deflagrada por um álbum que aos meus ouvidos resvala nas fronteiras da perfeição.

quinta-feira, 13 de agosto de 2020

Review: ⚡ Ellis / Munk Ensemble: 'San Diego Sessions' (2020) ⚡

Depois de uma travessia transatlântica com origem na Dinamarca e destino na idiossincrática cidade de San Diego (Califórnia, EUA) – a consumada Shangri-La do Heavy Psychedelic Rock – o conceituado músico nórdico Jonas Munk (Causa Sui) decidira liderar e timonar na honrosa companhia do influente Brian Ellis (Astra) toda uma populosa tripulação de consagrados músicos locais, provenientes de renomadas bandas como Radio Moscow, Sacri Monti, Monarch, Psicomagia, Astra e Ocelot, numa auspiciosa mas gloriosa odisseia musical. De âncora recolhida, velas içadas e bússolas apontadas a um aventuroso, eloquente, irreverente e engenhoso Avant-Garde Jazz envolvido e revolvido num criativo, dançante, contagiante e expressivo Progressive Rock regados a um sumarento psicadelismo Woodstock’eano e a um exótico experimentalismo sem fronteiras que o espartilhem, ‘San Diego Sessions’ representa uma carnavalesca conferência brilhantemente musicada por talentosos músicos de almas aparentadas que me dilatara as pupilas, salivara os ouvidos e enfeitiçara a alma do primeiro ao derradeiro minuto. Desdobrado em estéticas, intuitivas e proféticas Jams bronzeadas pelo Sol californiano e borrifadas pela brisa oceânica que pendulam entre a absorvente lisergia e a ardente euforia, ‘San Diego Sessions’ conserva – apesar da sua formação rotativa em cada um dos temas – uma reinante cumplicidade inata e transversal a todos os artistas que o esculpem e coloram. Na génese deste paradisíaco bacanal de magnetizantes diálogos instrumentais está uma messiânica guitarra Hendrix’eana de solos uivantes, espirais e esvoaçantes, um baixo bafejante de linhas vagueantes, hipnóticas e murmurantes, um carismático órgão de frescas melodias fabulares, cósmicos sintetizadores que auscultam os domínios alienígenas, e uma polvorosa bateria – que aliada a uma percussão tribalista – se manifesta em estonteantes acrobacias circenses. É-me ainda essencial elogiar o vistoso artwork – soberbamente desenhado pelo inconfundível traço de Alan Forbes – que conta com a inclusão de indiscretas alusões ao muito prestigioso ilustrador californiano Rick Griffin, um dos mais relevantes artistas responsáveis pela transposição para o universo visual de todo o psicadelismo musicado e borbulhado nos vivificantes anos 60. Degustem sem moderação este espirituoso cocktail de aroma tropical e vivenciem toda a onírica alquimia vaporizada por este fantástico colectivo de instrumentos revestidos a um dourado revivalismo. ‘San Diego Sessions’ será oficialmente lançado amanhã sob a forma física de CD e vinil através da insuspeita El Paraiso Records, e encerra legítimas aspirações de firmar uma posição de grande destaque por entre os melhores álbuns lançados este ano. Um disco que se vislumbra do tamanho das minhas expectativas a ele previamente apontadas. Prazenteiem-se neste rico banquete que vos saciará todos os sentidos, e embarquem num empolgante safari pela inesgotável liberdade criativa desta belíssima cidade à beira-mar plantada.

Links:
 El Paraiso Records

Review: ⚡ Rocky MTN Roller - 'Rocky MTN Roller' EP (2020) ⚡

Da cidade arborizada de Asheville (localizada no estado norte-americano de Carolina do Norte) chega-nos a psicotrópica radiação vaporizada pelo vulcânico EP de estreia do recém-formado quarteto Rocky MTN Roller. Esta jovem banda liderada pelo já afamado músico norte-americano Zach Blackwell (baixista de Danava e guitarrista de Lecherous Gaze) respira e transpira um fumegante, eufórico, melódico e picante Proto-Metal aliado a um extravagante, enérgico, caótico e delirante Heavy Psych de espírito Boogie que nos chicoteiam, revolvem e incendeiam com expressiva e altiva dominância. Oficialmente lançado no mês de Março sob a forma digital e muito recentemente também em cassete através do selo discográfico texano Olde Magick Records, este seu provocante, fogoso e contagiante registo homónimo traz-nos uma intensa efervescência sonora que nos enevoa, pontapeia e atordoa do primeiro ao derradeiro minuto. Contando ainda com resquícios de uma melancólica, musguenta e narcótica acidez que muito me faz recordar os saudosos Caustic Resin, a sua musicalidade vivificante, combativa, persuasiva e empolgante é (des)temperada a um toque garageiro que esporeia, ruboriza e chameja os quatro temas que o incorporam. São 18 minutos completamente atestados de uma febril ardência saturada e borbulhada por duas guitarras imperiosas que se auxiliam na ascensão de rumorosos, monolíticos e resinosos Riffs, e confrontam em épicos duelos de alucinantes, sensacionais e estonteantes solos em selvática debandada, um incansável baixo pululante de densa, tensa e sombreada reverberação, uma bateria Punky locomovida a destravado galope de uma enérgica, explosiva e frenética ritmicidade, e ainda uma liderante voz rugida de forma escarpada, cáustica e enrouquecida que apimenta ainda mais todo este exaltado caldeirão em crescente ebulição. ‘Rocky MTN Roller’ é um EP de alma rebelde que em nós detona todo um acalorado frenesim. Deixem-se absorver, fervilhar e euforizar pela ciclópica e despótica exuberância gritada e destilada pela arrebatadora estreia de Rocky MTN Roller, e velejem como conseguirem os tempestuosos mares que o governam.

Review: ⚡ Rafael Denardi - 'Adios, Rick' EP (2020) ⚡

Poucos meses depois de Rafael Denardi nos ter presenteado e alvoroçado com uma intensa dosagem de ardente, vistoso, ostentoso e empolgante Heavy Blues – brilhantemente lavrado e chamejado no seu fabuloso EP de estreia ‘Two Handfuls of Rock’ (nascido no início do presente ano, e aqui descrito e devidamente elogiado) – eis que este auspicioso, versátil e talentoso multi-instrumentista brasileiro redirecciona agora a sua bússola para os apaixonantes territórios de um elaborado, refrescante, deslumbrante e requintado Progressive Rock fielmente resgatado dos dourados anos 70 e aqui hoje espelhado com um (in)discreto cunho pessoal. Tal como a sua designação e respectivo artwork assim o sugerem, ‘Adios, Rick’ simboliza a sentida homenagem ao estimado e carismático baixo Rickenbacker 4003 que o autor natural da cidade de São Paulo entretanto vendera. Responsável pela condução de todos os instrumentos que o cultivam e pela criação da ilustração que o emoldura, Rafael Denardi tem neste seu novíssimo e segundo EP (gravado em sua casa durante o período de quarentena a que o vírus COVID-19 obrigou a humanidade) um registo que decerto merecerá a fascinada e entusiasmada aprovação de todos os devotos discípulos do clássico Prog Rock semeado e colhido no fértil solo setentista. Tendo o seu lançamento oficial agendado para o próximo dia 14 de Agosto através do exclusivo formato digital com o editorial carimbo autoral, ‘Adios, Rick’ é um sólido trabalho digno de conquistar a atenção das editoras discográficas fielmente dedicadas ao género em que o mesmo se insere, e consequentemente promove-lo em formato físico para gáudio de todos os seus ouvintes. Na génese de toda esta orgásmica simbiose instrumental, reina um fibrótico baixo de reverberação ondulada, viçosa, melodiosa e empolada, um glorioso órgão de frescas, esdrúxulas e principescas harmonias desdobradas a um imersivo erotismo, uma operante bateria de toque lustroso, acrobático, enfático e cuidadoso, e uma voz polida que deambula livre e graciosamente por todo este cabaret musicado. Sintonizado nas mesmas frequências de vultosas referências como Gentle Giant, Genesis, Atomic Rooster, Camel e Uriah Heep, este renovado rasgo de irretocável inspiração – inteiramente arquitectado e executado a uma só cabeça e duas mãos – causara e conservara em mim todo um intenso turbilhão de cegante sedução que me embriagara e arrebatara ao longo dos seus 18 minutos de extensão temporal. Este é um registo verdadeiramente magistral – oxigenado a um irresistível revivalismo que prontamente me hipnotizara e forçara a cair na sua tentação – e que apenas peca pela sua curta durabilidade. Depois de dois EP’s desiguais no que à tipologia sonora diz respeito (pois quanto à qualidade, o ponteiro continua a garantir altas rotações), resta saber com que género de surpresa sonora Rafael Denardi nos irá brindar na exploração do seu próximo trabalho. Isto, embora seja uma evidência de que muito dificilmente o mesmo não será do meu inteiro agrado e aqui seguidamente desmontado com recurso a sinceras palavras de apreço e devoção.

Links:
 Facebook
 Bandcamp

Review: ⚡ Atlanta - 'Nugrybauti' (2020) ⚡

Da Holanda chega-nos ‘Nugrybauti’, o segundo e novo trabalho de longa duração produzido pelo alucinante power-trio Atlanta. Oficialmente lançada na segunda metade do precedente mês de Julho tanto em formato digital como sob a forma física de vinil (reduzido a uma edição ultra-limitada à prensagem de apenas 250 cópias rotuladas pela editora discográfica local Lay Bare Recordings), esta extensível e apaixonante odisseia de interiorização via auditiva pela desmedida vacuidade do Cosmos bocejante tem como seu primordial combustível um intoxicante, imaginativo, expressivo e delirante Heavy Psych – distorcido por um sónico experimentalismo que nos atordoa a lucidez, e talhado a uma refrescante aura jazzística que nos matiza a embriaguez – que pendula entre a euforizante, carnavalesca e provocante efervescência e a relaxante, cinematográfica e extasiante quietude. A sua sonoridade maravilhosamente complexa, de paisagens e climas desiguais, é norteada e desenvolvida à boleia de intuitivas, exploratórias, enlouquecedoras e criativas jam’s de natureza e destreza puramente instrumentais provocam no ouvinte um inamovível estádio de ofuscante deslumbramento que o climatiza ao longo dos seus respectivos 62 minutos de duração. De pés descalços, enraizados nas bronzeadas e fervilhantes areias do deserto, e cabeça soterrada na vertiginosa e visceral verticalidade do negrume cósmico, somos seduzidos e conduzidos por uma uivante guitarra de exótico idioma Hendrix’eano que se perde e encontra por entre extravagantes, esvoaçantes, orgiásticos e estonteantes solos guiados a desarmante sagacidade e oleados a elevada toxicidade, um baixo pesadamente murmurante de serpenteantes, densas, tensas e ondeantes linhas sombreadas a fibrada reverberação, e uma bateria soberbamente Jazzy que – com um toque lustroso, saltitante, libertino e harmonioso – tiquetaqueia e capitaneia de forma airosa e graciosa toda esta temerária embarcação por nirvânicos e revoltosos mares que a esperam nos inesperados horizontes de ‘Nugrybauti’. Este é um álbum de estética veraneia onde a doce melancolia e a espirituosa euforia convivem em alegre concordância. Velejando e naufragando por todo um profundo espectro de emoções fortemente contrastadas, somos mutuamente sedados e agitados pela heterógena musicalidade de Atlanta. Inalem a fresca brisa suspirada pelas ondas do oceano e transpirem a vulcânica ardência que incendeia o deserto. Diluam-se no fértil improviso deste tridente holandês e experienciem todo o intenso encantamento farolizado pela magnetizante, admirável e dialogante simbiose que cola e não mais descola os três instrumentos. Uma das mais arrebatadoras surpresas sonoras do ano está aqui.