Review: ⚡ Snake Mountain Revival - 'Everything in Sight' (2021) ⚡

★★★★

Depois de dois pequenos – mas muito auspiciosos e largamente elogiados – passos discográficos (os EPs ‘Snake Mountain Revival’ de 2018 e The Valley of Madness' de 2019), este apaixonante power-trio localizado na cidade costeira de Virginia Beach (Virgínia, EUA) lança agora o seu muito ansiado primeiro registo de longa duração ‘Everything in Sight’ pela mão da parceria discográfica Ripple Music / Rebel Waves Records nos formatos digital, CD e vinil. Farolizado e oxigenado por um caleidoscópico, nebuloso, lustroso e quimérico Psychedelic Rock a fazer recordar All Them Witches, The Flying Eyes e King Buffalo, um onírico, hipnótico, xamânico e deslumbrante Krautrock de pálido tempero cósmico, e ainda um dançante, desértico, estético e contagiante Surf Rock de serpenteio Dick Dale’sco e clima Spaghetti Western que fará salivar o cineasta Quentin Tarantino, este paradisíaco álbum de estreia do trio Snake Mountain Revival aprisionara-me num inamovível estádio de nirvânica narcose, aspergida por um torpor idílico e revolvida por uma prazerosa náusea. A sua sonoridade sonhadora, mística e regeneradora – mergulhada no fantasmagórico efeito Reverb – desmaia as nossas pálpebras sobre um olhar distante, descortina um genuíno sorriso, massaja o cerebelo, embacia a lucidez e embala-nos numa sonâmbula vertigem em slow-motion de membros paralisados e sentidos embriagados. Baloicem pesadamente os vossos corpos temulentos neste delirante jogo de espelhos à purificante boleia de uma guitarra alucinógena que se passeia em enigmáticos, cativantes, atordoantes e seráficos Riffs de onde esperneiam solos uivantes, venenosos, vistosos e penetrantes, um baixo ronronante de linhas encaracoladas, fluídas, movediças e pulsantes, uma bateria tribalista de galope envolvente, estimulante, ritmado e eloquente, e ainda uma voz libidinosa, mélica, sidérica e charmosa – de lirismo poético e profético – que ressoa por todo este açucarado, mágico e sublimado sonho musicado. São 44 minutos de dormência sensorial e afago espiritual que nos deambulam pelas esbatidas, vaporosas e embevecidas paisagens sonoras de ‘Everything in Sight’. O esdrúxulo artwork de características surrealistas aponta os seus créditos autorais ao pintor russo Stanislov Pobytov. Este é indubitavelmente um dos meus álbuns favoritos do ano. Um disco cozinhado a apurada subtileza, afrodisíaco requinte e imaculada beleza, que tão bem combina a odorosa delicadeza com a fogosa rudeza. Dissolvam-se nesta brumosa alquimia de ofuscação balsâmica e imersão ritualista de pleno encanto sem fim à vista.

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 Ripple Music
 Rebel Waves Records

Review: ⚡ It was the Elf - 'Ancestors' (2021) ⚡

★★★★

Com o lançamento oficial do novo álbum ‘Ancestors’ calendarizado para o dia de amanhã – 25 de Novembro – pela mão da influente editora discográfica portuguesa Raging Planet nos formatos digital e CD (este último limitado a 300 cópias), os serranos It was the Elf – localizados na cidade de Gouveia (distrito da Guarda) – dão assim mais um firme passo em frente na triunfante caminhada pela sua afirmação dentro do panorama musical nacional. Norteado por uma evocação e devoção ancestrais, este quarteto beirão traja um trevoso, enérgico, colérico e fibroso Heavy Rock em simbiótica parceria com um fogoso, carismático, enfático e montanhoso Grunge Rock resgatado aos saudosos anos 90. De rédeas empunhadas, maxilares cerrados, olhar incendiado e esporas ensanguentadas, a estrondosa sonoridade de ‘Ancestors’ é carburada e troteada por uma impiedosa cavalaria pesada que ocasionalmente descontrai nos orvalhados, meditativos, lenitivos e embrumados campos de um plácido, etéreo e embriagado Psychedelic Rock. Para lá do lustroso tilintar dos chocalhos que sonoriza a pastorícia, do latir dos cães que fere o bucólico e imersivo silêncio rural, e do harmonioso chilrear dos pássaros que anuncia a tímida madrugada de um novo dia na serra, adensa-se e agiganta-se todo um monolítico tsunami de crepitante distorção nas cordas troantes, tambores tribais e vocais guturais de It was the Elf. Deixem-se encarvoar nas negras lavaredas que afogueiam ‘Ancestors’, e vibrem à sísmica deflagração de uma guitarra erosiva que vocifera musculosos, apimentados, encrespados e imperiosos Riffs e vomita solos serpenteantes, ácidos, fosforescentes e delirantes, um baixo obeso de intumescida, tensa, espessa e sombreada reverberação, uma intensa, agressiva e incisiva bateria de baquetas em chamas, e uma voz felina que – pendulando entre escarpados, rouquenhos e melódicos rugidos, e tonalidades cristalinas, delicadas e espaciais – ressoa e ecoa por todas as atmosferas deste álbum. São 50 minutos atestados de acentuados contrastes climatéricos, onde coabitam a glacial letargia e a vulcânica euforia. Subam até ao cume desta alterosa serra e avistem todo o esplendor, domínio e vigor de um dos melhores registos portugueses do ano.

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 Raging Planet

Review: ⚡ Madera Raíz - 'No les queda tanto Tiempo' (2021) ⚡


★★★★

Oriundo da vibrante cidade-capital de Buenos Aires chega-nos o muitíssimo aguardado álbum de estreia do electrizante power-trio argentino Madera Raíz, acabado de ser retirado do forno sob a exclusiva forma digital e carimbado com selo de autor. Herdeiros da sagrada musicalidade deixada e perpetuada pelo lendário Pappo, este tridente de instrumentos engatilhados e olhar fulminante ostenta um provocante, oleado, ritmado e inflamante Heavy Blues de balanço Boogie e tração setentista, aliado a um efervescente, bombástico, caleidoscópico e ardente Heavy Psych de roupagem crivada por negros adereços Proto-Doom’escos e toxicidade a perder de vista. A sua sonoridade picante, entusiástica, afrodisíaca e rutilante – sintonizada nas mesmas frequências de clássicas referências como Black Sabbath, ZZ Top, Cactus e Pappo’s Blues – é remexida, fervida e servida em dançantes chamas. Com uns velozes 32 minutos de duração – fragmentados em quatro temas originais e uma versão cover da primitiva e largamente imitada “Spoonful” (originalmente escrita por Willie Dixon e gravada pela primeira vez em 1960 por Howlin' Wolf) captada num concerto ao vivo em 2019 com tremulantes, avinagrados e enfeitiçantes vocais femininos a encerrar o disco em apoteose – ‘No les queda tanto Tiempo’ é um registo escaldante que nos sobreaquece, bronzeia e pontapeia de embriagada euforia. Na composição deste espirituoso bourbon efervescem uma jupiteriana guitarra de umbrosos, pesados, defumados e poderosos Riffs consumidos pela urticante distorção, de onde gritam e esvoaçam alucinantes, ácidos, selváticos e trepidantes solos em sónica evasão, um baixo musculado de reverberação baloiçada, tensa, densa e ondulada, uma bateria acrobática, enfática e pujante de timbalões escoiçados e pratos flamejantes, e uma voz liderante – de entoação aristocrática e ínfimos rugidos de textura escarpada – que emerge e se agiganta nesta fumarenta ebulição instrumental. Num plano secundário – no que à constância de protagonismo diz respeito – são ainda trazidos pela brisa do velho oeste os sopros arenosos, odorosos e penetrantes de uma harmónica, e perscrutam-se também ecos do virtuoso espanhol Paco de Lucía num Flamenco dissimulado e de ornamentos cuidadosamente escalados pelo encordoamento de uma guitarra acústica. Este é um trabalho do tamanho das minhas expectativas a ele dedicadas. Embalem na enlouquecedora vertigem desta aparatosa montanha-russa que irá pôr à prova a solidez estrutural da vossa sanidade mental, e vivenciem com vulcânico empolgamento de erupções à flor da pele todo este furacão de endorfinas superiormente domesticado pela talentosa formação alviceleste.

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domingo, 21 de novembro de 2021

sexta-feira, 19 de novembro de 2021

Review: ⚡ Electric Moon meets Talea Jacta - 'Sabotar' (2021) ⚡

★★★★

Quis o destino que o trio germânico Electric Moon e o duo português Talea Jacta se encontrassem e partilhassem o mesmo palco do saudoso Sabotage Club (emblemático espaço cultural situado na cidade de Lisboa que infelizmente não sobrevivera ao duradouro confinamento imposto pela pandemia) no já distante verão de 2019, e daí nasceu esta intuitiva, absorvente e criativa Jam session conjunta chamada ‘Sabotar’. Lançado hoje mesmo pela mão do insuspeito selo discográfico alemão Sulatron Records (casa-mãe de Electric Moon) nos formatos físicos de CD e vinil (ambos limitados à prensagem de apenas 500 cópias disponíveis) esta ousada, mas bem-sucedida, parceria Electric Moon meets Talea Jacta tece uma labiríntica, ritualística, mística e elaborada teia sonora onde coabitam e dialogam um intrigante, hipnótico, cósmico e enfeitiçante Neo-Krautrock com vista para as estrelas, e um deslumbrante, caleidoscópico, tóxico e atordoante Neo-Psychedelic Rock que nos escancara as portas da percepção. Climatizado ainda por um exótico experimentalismo sem complexos que o inibam ou fronteiras que o espartilhem, ‘Sabotar’ vem compartimentado em três arejadas, longas e viajadas Jam’s de índole instrumental que desatam o Ego do ouvinte e o arremessam para as abissais profundezas do negrume celestial. São 42 minutos de uma texturizada, alcoolizada e inescapável narcose que nos dilata as pupilas, empalidece o semblante, e naufraga o espírito na incomensurável obscuridade cósmica. Como composição desta nebulosa, lisérgica e misteriosa alquimia musical perfilam-se duas guitarras xamânicas – soterradas na espessa bruma de toda uma profusão de esquizofrénicos efeitos – que se entrelaçam na edificação de uma enlouquecedora escadaria de Riffs em forma de espiral, e desenlaçam e atropelam na emancipação de efervescentes, ácidos, delirados e uivantes solos que nos rasgam as vestes da lucidez, um baixo soberbamente Krauty – de linhas vagueantes, inchadas, encaracoladas e oscilantes – que anoitece toda esta atmosfera onírica, e duas baterias siamesas que embaladas e compenetradas num trautear incessante, cativante e tribalista fazem pulsar todos os solitários astros sepultados no trevoso solo do Cosmos bocejante. O estético artwork de essência mitológica aponta os seus créditos autorais à ilustradora Komet Lulu (a própria baixista de Electric Moon). Imóveis, boquiabertos e de almas aturdidas, experienciem todo este exorcismo planetário superiormente liderado pela fusão destas duas bandas que falam o idioma das estrelas. Não vai ser nada fácil – ou sequer desejado – despertar deste sonho acordado.

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 Electric Moon (FB)
 Talea Jacta (FB)
 Sulatron Records
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Review: ⚡ STEW - 'Taste' (2021) ⚡

★★★★

Depois de lançados o EP ‘Hot’ (aqui examinado) e o álbum de estreia ‘People’ (aqui analisado e posteriormente aqui medalhado como um dos melhores álbuns de 2019), os escandinavos STEW servem agora o seu segundo trabalho de longa duração, designado ‘Taste’ e promovido com o carimbo editorial da discográfica germânica Uprising Records no formato físico de vinil. Este electrizante power-trio sueco – natural da pequena cidade de Lindesberg – mantém-se fiel à bem-sucedida receita musical que os acompanha já desde a sua fundação, ostentando um majestoso, fogoso, atraente e imperioso Heavy Blues de inspiração revivalista em parceria com um lubrificado, elegante, espadaúdo e apimentado Hard Rock de roupagem setentista. Permutando entre vulcânicas, vistosas, libidinosas e titânicas galopadas locomovidas à rédea larga, e lustrosas, açucaradas, gloriosas e melódicas baladas sorvidas numa melosidade imprópria para diabéticos, este contagiante ‘Taste’ é um álbum imensamente voluptuoso que combina a delicadeza com a rudeza, a leveza com a robustez e a placidez com a efervescência numa suculenta iguaria de fácil digestão e imediata veneração.  Cortejados, embalados e enleados pela intensa sedução de STEW, rebaixamos as pálpebras, curvamos a linha labial na direcção do sorriso, coramos as bochechas e dançamos de forma detida e apaixonada ao simbiótico, quente e erótico som de uma guitarra charmosa que se conduz pelas sinuosas estradas de dinâmicos, pomposos, esculturais e corpulentos Riffs – chamejados a ardente distorção de faúlhas crepitantes e borbulhante conflagração – e venenosos, alucinógenos, orgiásticos e vaidosos solos gritados e centrifugados a arrebatadora afinação, um bafejante baixo reverberado a bailantes, densas, tensas e oscilantes linhas que sombreiam e empolam o Riff-base, uma acrobática bateria de apurada tecnicidade e enfática explosividade que esporeia e incendeia toda esta detonação de prazer, e uma reinante voz de pele mélica, rouquenha, simétrica e felina – envernizada a abrasivo Whiskey – que surfa com desarmante extravagância os polposos, revoltosos e fosforescentes caudais de incandescente magma que estriam este fumegante e gorgolejante vulcão em incessante erupção. São 39 minutos atestados de extasiante fervura e sufocante doçura que nos banham, sobreaquecem e assanham do primeiro ao derradeiro tema. ‘Taste’ é um álbum verdadeiramente edificante e apoteótico. Deixem-se inundar nos profundos odores transpirados por esta sublimada obra de beleza depurada e destreza apurada, e vivenciem toda a obcecante magnificência irradiada de um dos mais carismáticos discos do ano. Consumam-no sem moderação, pois é humanamente impossível ouvi-lo apenas uma vez, duas ou três.

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 Uprising Records

Review: ⚡ Møtrik - 'MØØN: The Cosmic Electrics of MØTRIK' (2021) ⚡

★★★★

Com a base espacial situada na cidade de Portland (Oregon, EUA), os astronautas musicais Møtrik acabam de lançar um novo capítulo da sua aventurosa expedição astral, designado de ‘MØØN: The Cosmic Electrics of MØTRIK’, e promovido pelo selo discográfico local Jealous Butcher Records através dos formatos digital, CD e vinil (este último ultra-limitado à prensagem de apenas 100 exemplares). Compassado a um dançante, imersivo, repetitivo e enfeitiçante Krautrock de descendência germânica e com um pigmento de caleidoscópico psicadelismo – que aponta influências a incontornáveis referências do género, tais como Can e Neu!, e se sintoniza na mesma frequência de outras mais contemporâneas como por exemplo Moon Duo e Föllakzoid – e condimentado a um viajante, ritualístico, místico e deslumbrante Space Rock de sónicas experimentações Hawkwind’eanas que faroliza, pisa e mapeia as zonas mais recônditas do Cosmos, este quinto álbum do quarteto norte-americano tem a capacidade de desancorar o ouvinte da gravidade terrestre, destrancar a sua consciência e levitá-lo por entre chamejantes fornalhas estelares, rochosas cinturas de asteroides, poeirentas nebulosas e solitários planetas sepultados no negro solo do espaço sideral. A sua sonoridade ventilada, espaçosa e absorvente é tiquetaqueada a um ritmo catalisador e oxigenada a um experimentalismo desorientador, causando e imortalizando em nós todo um sagrado estádio de emancipação sensorial e consagração espiritual. De olhar eclipsado, rosto desmaiado, semblante baloiçado e espírito integralmente maravilhado, somos cativados e passeados pela infinidade do Cosmos à boleia de uma metronómica bateria embalada a um compasso robótico, persistente, eloquente e hipnótico, um baixo groovy que bafeja pulsantes, maleáveis, veneráveis e ondeantes linhas, uma guitarra alucinógena de místicos, coloridos, ziguezagueados e psicotrópicos devaneios, uma voz profética de tez etérea, frágil, sedosa e espectral, e ainda toda uma vistosa alquimia magicada por enigmáticos sintetizadores que dialogam entre si através de coros alienígenas. São 63 minutos de uma extasiante, morfínica, terapêutica e atordoante hipnose que nos relaxa o corpo, cura a alma e massaja o cérebro. Deixem-se imergir, diluir e sublimar nas abissais profundezas de Møtrik, e embarquem numa comatosa e onírica excursão sem garantias de regresso à realidade.

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 Jealous Butcher Records

Review: ⚡ Kanaan - 'Earthbound' (2021) ⚡

★★★★

Depois de ‘Windborne’ (aqui examinado), ‘Odense Sessions’ (aqui examinado) e ‘Double Sun’ (aqui examinado), eis que o jovem e talentoso tridente norueguês Kanaan – sediado na capital Oslo – acaba de lançar o seu quarto álbum de estúdio, denominado de ‘Earthbound’ e carimbado pela companhia discográfica local Jansen Records através dos formatos digital e vinil. Enegrecendo, dinamitando e robustecendo a musicalidade que norteara os seus antecessores, este bombástico e aparatoso Earthbound’ associa um inflamante, tonificado, carregado e euforizante Heavy Psych de atemorizantes feições Doom’escas a um estonteante, acrobático, enfático e electrizante Jazz-Rock lavrado a sónico experimentalismo, e ainda a um imersivo, hipnótico, quimérico e meditativo Krautrock que orvalha os efémeros estágios de etérea bonança nesta bélica e implacável tempestade instrumental. A sua sonoridade intensamente efervescente, montanhosa, portentosa e erodente agiganta-se perante o ouvinte num impactante, monolítico e chamejante tsunami de endorfinas que o sombreia e incendeia de sísmica exaltação. Conseguem imaginar os lendários Kyuss à saída de uma academia de Jazz com o diploma debaixo do braço? Se sim, então acabam de pisar os abrasivos territórios onde germinara e frutificara este novo álbum de Kanaan. Na composição do combustível que nutre toda esta vertiginosa propulsão, alinham-se uma titânica guitarra – banhada, distorcida e encrostada pelo infernal, crocante e borbulhante efeito Fuzz – que vocifera fogosos, ciclónicos, tirânicos e monstruosos Riffs de onde descarrilam nervosos, uivantes, ácidos e sinuosos solos, um fibrótico baixo valvulado a linhas pulsantes, inchadas, onduladas e possantes, uma selvática bateria em polvorosa que escoiceia – a frenética agilidade, enérgica explosividade e desmedida tecnicidade – os timbalões trovejantes e os pratos relampejantes, e ainda um mágico sintetizador que asperge a atmosfera do disco de um edénico misticismo estelar. O artwork minimalista de design futurista aponta os seus créditos autorais ao inconfundível artista sueco Robin Gnista. São 44 minutos governados por um caótico bombardeamento que nos agride e amotina, aliado a um psicotrópico atordoamento que nos embacia a lucidez e atesta de pesada embriaguez. ‘Earthbound’ é um registo verdadeiramente expressivo, pujante, tonitruante e incisivo – de longe o mais trevoso da sua discografia – que fará estremecer de vibrante e caloroso empolgamento todo aquele que ousar enfrentá-lo. Deixem-se arrastar e embalar à boleia da forte corrente de ‘Earthbound’, e naufragar num centrifugado delírio. Um dos grandes discos do ano está aqui, na revitalizante força dos transmutados Kanaan. É impossível escapar disto ileso. Encarvoem-se, revolvam-se e empoderem-se nele.

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 Jansen Records

Review: ⚡ Baron Crâne - 'Les Beaux Jours' (2021) ⚡

★★★★

Proveniente de França chega-nos o extraordinário novo álbum do talentoso power-trio parisiense Baron Crâne, intitulado ‘Les Beaux Jours’ e lançado através dos formatos digital, CD e duplo vinil em meados do passado mês de Outubro pela mão da jovem companhia discográfica francesa Mrs Red Sound. Neste colorido, odoroso e texturizado sortido sonoro emergem e sobressaem um majestoso, carnudo, sisudo e sinuoso Prog Rock de carregadas feições King Crimson’eanas, um aventuroso, labiríntico, burlesco e aparatoso Jazz Fusion a fazer lembrar a multinacional Mahavishnu Orchestra, e um musculoso, oleado, vultoso e vertebrado Hard Rock motorizado à boa moda de Deep Purple. Contando ainda com a veraneia ritmicidade de um contagiante Funk n’ Reggae tropical, a caleidoscópica pirotecnia de um exótico Psychedelic Rock, e a indesmontável equação de um esquizofrénico Math Rock, a emaranhada, ornamentada e piramidal sonoridade de ‘Les Beaux Jours’ passeia-se de forma envaidecida – e por vezes enraivecida – pelos sete temas de essências desiguais que compõem esta elaborada obra-prima. Levemente acariciado por embaciadas, etéreas e relaxadas passagens de beleza bucólica e clima melancólico, e pesadamente galopado pelos instrumentos ofegantes em redentora debandada, este quarto trabalho de longa duração de Baron Crâne representa o pináculo da sua apurada maestria musical. Na constituição desta musicada depuração dialogam entre si uma guitarra dominante que se agiganta em Riffs propulsivos, altivos, mastodônticos e incisivos de onde esvoaçam solos trepidantes, ácidos, delirados e gritantes, um baixo ronronante de linhas marulhantes, densas, tensas e protuberantes, e uma entusiástica bateria jazzística de fogosas, explosivas, criativas e engenhosas investidas. Num plano secundário – no que à sua predominância diz respeito – vagueiam ainda pela atmosfera circense do álbum um esdrúxulo saxofone de sopros vistosos, charmosos e berrantes, uma poética flauta de uivos sedosos, airosos e lunares, e ainda duas vozes contrastadas – uma a fazer recordar os ardentes rugidos do saudoso Chris Cornell, e outra mais delicada e de condimento celestial – que repartem a sua liderança pelos dois únicos temas que escapam à hegemonia instrumental. De estender os aplausos ao peculiar artwork de colagens pensadas e executadas pela artista parisiense Nora Simon. São 50 minutos de fascinante imprevisibilidade e desarmante tenacidade que nos mantêm os sentidos em alerta. Um registo mutuamente claustrofóbico e emancipador, agressivo e lenitivo, desatado e entrançado. Percam-se e encontrem-se neste caótico jogo de espelhos. Vai ser demasiado fácil reencontrá-lo por entre os mais condecorados álbuns lançados este ano.

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 Mrs Red Sound

segunda-feira, 8 de novembro de 2021

🎼 ALL THAT IS JAZZ!

Roy Haynes Charles Mingus Thelonious Monk Charlie Parker