Depois de em 2018 ter sido
lançado o seu impactante álbum de estreia ‘Windborne’ (Review
aqui) e de já em meados do passado mês de Fevereiro ter sido apresentado
o seu segundo trabalho ‘Odense Sessions’ (Review aqui),
eis que o talentoso tridente norueguês Kanaan acaba de presentear toda a
sua crescente legião de fieis discípulos com a aparição do seu terceiro registo
de longa duração. Denominado de ‘Double Sun’ e devidamente
promovido através do insuspeito selo discográfico dinamarquês El Paraiso
Records (com o qual a banda vai reforçando o seu vínculo editorial) nos
formatos físicos de CD e vinil, esta nova obra inspiradora da jovem formação
nórdica traz-nos um admirável equilíbrio das essências desiguais que nortearam
os seus dois discos antecessores. Lavrado, bordado e desenvolvido por um
sofisticado, cerebral e elaborado cocktail sonoro de onde facilmente se identifica
e saboreia um exótico, purificante e enigmático Jazz Fusion de
inspiração apontada aos fabulosos britânicos Soft Machine e à lendária multinacional Mahavishnu Orchestra, um deslumbrante,
sublime e serpenteante Prog Rock de ares revivalistas que se balanceia
entre a carnavalesca exuberância de uns King Crimson e a onírica
majestosidade de uns YES, um ensolarado, primaveril e perfumado Psychedelic
Rock de inebriante radiância que resvala na envolvência cinematográfica do Post
Rock, e ainda um hipnótico, imersivo e meditativo Krautrock – ainda
que de presença mais destemida e vincada na ponta final do álbum – sintonizado
na mesma frequência que os clássicos germânicos NEU! e CAN, este trabalho toca as fronteiras da tão ambicionada perfeição. A sua
musicalidade de desígnios complexos pendula entre etéreas passagens de uma
refrescante, paisagista e extasiante lisergia, e espalhafatosos momentos de
sónico, eufórico e selvático experimentalismo. Na génese desta apaixonante conjugação
entre a frenética tempestuosidade e a pacífica mansidão, imperam os virtuosos egos
de uma guitarra erudita que se passeia por cristalinas paisagens temperadas a quimérica
letargia e outras chamejadas pelo vulcânico efeito Fuzz, um baixo
motorizado a linhas errantes, livres, viçosas e ondeantes, e uma bateria circense
de toque cintilante, polido, preciso e entusiasmante. ‘Double Sun’
é um primoroso álbum de beleza e destreza consumadas. Um registo governado por
um simbiótico misticismo onde cada um dos instrumentos tem total liberdade de
movimentos – naufragando num criativo rasgo de catártica e extravagante comoção
– sem que percam o seu apurado sentido de orientação. É, indubitavelmente, o meu disco de eleição produzido por este luxuoso power-trio sediado em Oslo. Recostem-se relaxadamente, apertem os cintos e preparem-se para vivenciar a acrobática sinuosidade de uma delirante montanha-russa que vos baralhará os
sentidos e descarrilará a lucidez. Estamos na distinta presença de uma caprichosa
iguaria pronta a saciar a sede dos ouvidos mais exigentes. Um dos mais épicos
discos de 2020 está seguramente aqui, na portentosa detonação criativa de Kanaan.
Empoderem-se nele.
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