quinta-feira, 10 de outubro de 2013

Madrid, a capital do Paraíso!

Antevendo o valor absurdo da cerveja no interior da Sala Caracol, empunhámos latas de cerveja compradas por um preço acima do razoável numa mercearia ali perto. A passos curtos – devido à populosa fila da qual fazíamos parte - fomos afunilando até à bilheteira. Ainda cá fora, recebemos um agradável e surpreendente “Olá” de dois dos melhores pescadores musicais que Portugal conhece (eles perdoam-me a metáfora elogiosa, espero): o Ricardo e a Telma, organizadores do festival Sonic Blast em Moledo do Minho. Tempo para trocar palavras amigáveis e manifestar prognósticos sobre o que se avizinhava. Já El Páramo fustigavam os seus instrumentos quando entrámos na Sala Caracol de atenções viradas para o palco. Depois de ter visto Om em 2010 nessa mesma sala actuarem para 1/3 da sua lotação, foi com uma sensação estrangeira que a vi apinhada de público. Também era repetente no que diz respeito a ver ao vivo Colour Haze (no saudoso festival de rock & psicodelia del Castell de Guadalest em 2009) e My Sleeping Karma (no fervilhante Up In Smoke vol.III (Munique) em 2011). Enquanto El Páramo disferiam na atmosfera sonora o seu Stoner Rock sem qualquer tempero e travão, avançámos até ao balcão mais próximo para beber uma cerveja. A intenção primária era pedir uma cerveja para cada um, mas quando ouvimos a exagerada quantia de 9 euros por cada cada uma, decidimos comprar apenas uma pelos - e para os - quatro. No meio de queixumes revoltosos regressámos à plateia para atracar os nossos corpos e assistir com atenção ao resto da actuação dos madrilenos El Páramo. Depois de pousarem os instrumentos, o cheiro a suor, o vácuo nos ouvidos e o coração ainda ofegante descreveram a ressaca do concerto. Polegar levantado a esta banda que muito possivelmente chefia o pelotão do Stoner Rock espanhol (depois de Viaje a 800 anunciarem a sua saída dos palcos). Seguia-se My Sleeping Karma e o meu coração debatia-se contra os pesados ventos da ansiedade. Ventos esses que me obrigaram a galgar terreno até à frente do palco. Quando estes quatro peregrinos das estradas hinduístas pisaram o palco, senti a inabalável certeza de que dariam um dos concertos da minha vida. E assim foi! My Sleeping Karma aceleraram rumo a um concerto tremendamente arrebatador e delirante. Os corpos da plateia respondiam a esta verdadeira ode espiritual com hipnóticas danças conduzidas de olhos fechados. Eu sussurrava para mim mesmo as já familiares linhas de baixo enquanto levitava pelas encantadas estradas do riff. A harmonia foi soberana na Sala Caracol, e nem as quebras de luz abrandaram a emotividade transpirada pelo quarteto alemão. A ambiência estava mais entusiástica que nunca. Depois de assistir pela segunda vez a este perfeito exorcismo que é ver ao vivo My Sleeping Karma, afirmo sem gaguejar que é uma penetrante experiência transcendental a que o nosso corpo e mente responde com êxtase. My Sleeping Karma abriram as portas da percepção, e posso jurar que no meio dos entusiastas aplausos finais, avistei a deusa Krishna dedicar-lhes prolongadas vénias. Quando as cortinas se fecharam, pude atentar toda uma plateia ainda a recompor-se daquela intensa viagem espiritual. Mas não houve tempo de regressar ao planeta Terra, até porque Colour Haze já afinavam os instrumentos perante um público ruidoso e de corações ao alto. Este trio germânico instaurou um perfeito manto primaveril sob os nossos pés e proporcionaram-nos a vivência de uma realidade tão para lá da conhecida. A ataraxia foi o único ar respirável. Temas como “Aquamaria”, “Tempel”, “Transformation”, “Moon”, "Peace, Brothers & Sisters!", "Get it On" e “Love” alimentaram o nosso organismo com THC. A plateia sentia com enorme evidência toda aquela fragância sedutora e entregava a sua conduta aos riffs orgásmicos que a guitarra de Stefan Koglek expelia na atmosfera. O Paraíso florescia ali. Colour Haze brindaram-nos com cerca de duas horas do melhor que a música pode provocar no ser humano. Foi um concerto para levar comigo vida fora, e a extensão do mesmo ainda perdura na minha cabeça e no meu coração.            

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