sexta-feira, 11 de outubro de 2024

Review: ☄️ The Verge - 'The Verge' (2024) ☄️

★★★★

É ainda de lucidez levemente atordoada e alma pesadamente embevecida que escrevo estas palavras acordadas, recém-surgidas à tona da perdurável ressaca que se seguira às múltiplas audições que eu dedicara a este impactante álbum de estreia do talentoso quarteto norueguês The Verge. Licenciados no ensino superior da música Jazz, estes irreverentes “Jazz Cats” naturais da cidade de Oslo começaram a dar os seus primeiros concertos locais em 2019 e em 2021 gravaram o seu homónimo registo de estreia que só no presente ano veria, finalmente, a luz do dia, descortinado pela jovem companhia discográfica norueguesa Is it Jazz? Records (filha da conceituada Karisma Records e especializada nos diversos sub-géneros da música Jazz) sob a forma de LP, CD e digital. Fruto suculento de uma exótica árvore repleta de enxertos sonoros, ‘The Verge’ mostra-se orgulhosamente ao mundo sob a forma de um deslumbrante puzzle musical, de incitamento e excitamento mentais, onde um sensacional, excêntrico, magnético e cerebral Jazz Rock de aventurosas aterragens no electrizante território do Jazz Fusion e aparatosas despistagens no escorregadio pavimento do Avant-garde Jazz, um hipnótico, taciturno, nocturno e melancólico Contemporary Jazz de imersiva e contemplativa beleza cinematográfica, e um matemático, sinuoso, oleoso e enfático Prog Rock de esdrúxulo e dramático sotaque Zeuhl’esco se prendem e desprendem numa enfeitiçante e apaixonante dança gravitacional. Combinando a paródia circense do célebre Frank Zappa, a cerimonial dissonância dos franceses Magma, a reflexiva bonança do dinamarquês Jakob Bro e os psicotrópicos remoinhos dos britânicos Soft Machine, a eloquente, viva e multifacetada sonoridade de The Verge passeia-se envaidecidamente por ambientes desiguais que nos lapidifica, terrifica e aprisiona num claustrofóbico labirinto sem porta de saída, anoitece, inebria e mergulha nas profundezas abissais da doce melancolia, e estremece, embala e ensurdece na sónica vertigem de um alucinante vórtice. Um verdadeiro safari jazzístico – norteado por um virtuosismo supremo, climatizado por uma constante alternância entre a tormenta e a tranquilidade, e condimentado por um experimentalismo sem fronteiras – que nos viaja sem cinto de segurança. Nas fileiras desta criativa orquestra de apenas quatro músicos, dialogam – numa petrificante simbiose – uma infatigável, enérgica e intratável bateria em polvorosa que se desvaria em espalhafatosas acrobacias e desdobra em furiosas e fogosas investidas, uma estética guitarra de atmosféricos acordes que nos roubam o ar do peito e solos ciclónicos que nos rodopiam e naufragam, um baixo elástico de linhas polposas, bailantes, magnetizantes e libidinosas, um saxofone esquizofrénico que tanto se perde num louco turbilhão de berrante e gritante histerismo, como se encontra numa sedosa e calmosa elegia de uivos lunares, e uma flauta de sopros odorosos, serpenteantes e veludosos que anuncia o efémero término do estado de emergência em que este álbum reside. ‘The Verge’ é um disco imensamente elaborado, inspirado e cativante que não dará descanso às glândulas salivares dos indefectíveis aficionados do expansível universo da música Jazz. Uma obra inteiramente pensada, arquitectada e esculpida à minha imagem. Sempre que me embrulho e divago nos seus meandros, tudo em mim suspira que se trata mesmo do meu álbum favorito deste ano (dos lançados até ao momento que não escaparam ao olhar atento do meu radar), e o acumular de renovadas audições só incrementa o transbordante fascínio a ele dedicado.

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