Review: 🌲 Pershagen - 'Hilma' (2022) 🌲

★★★★

Depois de lançados os álbuns ‘Den Siste Av Mitt Namn’ (análise aqui) e ‘Tarfala’ (análise aqui), o fascinante quarteto sueco Pershagen descortina agora o seu terceiro álbum de estúdio, denominado ‘Hilma’ e exteriorizado hoje mesmo na íntegra sob a forma digital e vinil (este último bipartido em duas edições contrastadas, limitadas a 500 cópias cada) com o carimbo do selo discográfico local Lövely Records. Replicando os ingredientes que apaladaram os seus antecessores, ‘Hilma’ vem orvalhado por um melancólico, bucólico, sublime e cinematográfico Post-Rock, um arejado, reflexivo, lenitivo e ensolarado Psychedelic Rock de aura Western, e ainda discretos elementos de um poético, anestésico e outonal Folk de húmido clima nórdico. Conduzido a onírica placidez, ataráxica fluidez e ternurenta delicadeza, esta nova obra da formação sueca pincela no imaginário do ouvinte musgosas, montanhosas, verdejantes e idosas florestas que emergem na fantasmagórica e vaporosa intimidade da brumosa madrugada que se vai dissolvendo e rendendo à diluviana luz do dia. Todo um nirvânico voo – de olhar deslumbrado, espírito embevecido e sentidos emudecidos – sobre os místicos, fantasiosos e druídicos bosques escandinavos que se desdobram pela infinidade adentro. Inalem a reconfortante e revitalizante frescura de Pershagen à extasiante boleia de duas guitarras etéreas que se ensoberbecem em aquosos, comoventes e cheirosos acordes – sublinhados de perto pelos arrepiantes uivos de um desértico pedal steel que nos traz o cálido e afogueado crepúsculo do velho oeste – de onde serpenteiam bailantes, ecoantes e translúcidos solos, um baixo movediço de linhas vagueantes, encaracoladas, sombreadas e magnetizantes, e uma bateria jazzística superiormente tiquetaqueada a ofuscante resplandecência, fina argúcia e desarmante elegância. São 40 minutos oxigenados por um quimérico torpor que nos hasteia uma sensação libertadora, desenha o sorriso no rosto, massaja o cérebro e perpetua no olhar uma expressão sonhadora. Este é um disco tristemente belo. Um registo balsâmico – de atmosfera inebriante, apaixonante e desorientadora – que não deixará ninguém recostado à indiferença. Não vai ser fácil ascenderem à tona deste profundo sonho e quebrarem todo um febril estádio de transe espiritual. Embaciem-se e diluam-se nele.

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Review: 🔥 Thick - 'Audio Obesity' (2022) 🔥

★★★★

Originário da cidade sueca de Gotemburgo chega-nos o cálido e urticante bafo nasalado pelo maturado álbum de estreia cuidadosamente fermentado pelo electrizante tridente Thick, intitulado ‘Audio Obesity’ e recentemente lançado através da exclusiva forma digital. Gravado num longo intervalo temporal – entre o já longínquo ano de 2014 e 2020 – este seu primeiro passo discográfico traz-nos a ardente melosidade transpirada de um apimentado, libidinoso, charmoso e oleado Blues Rock de vibrante serpenteio boogie, encerado e abrilhantado por um vivificante, empolgante, contagiante e revivalista Hard Rock de forte aroma setentista. Combinando a irreverente frescura de nomes contemporâneos como os californianos Joy, os Dirty Streets do Tennessee e os helvéticos The Dues com a desarmante formosura espelhada de clássicas e incontornáveis referências como Rory Gallagher, Cactus e ZZ Top, a buliçosa, estética e voluptuosa sonoridade de ‘Audio Obesity’ presenteia e incendeia o ouvinte com duas mãos cheias de temas que o manterão de ânimo radiante e cabeça rodopiante do primeiro ao derradeiro minuto. Pendulando entre fogosas correrias que nos inquietam e euforizam, e breves passagens etéreas que nos embrumam e narcotizam, este expressivo power-trio de raiz nórdica é chamejado e locomovido por uma ostentosa guitarra de Riffs gordurosos, dançantes, estimulantes e alterosos, e solos esvoaçantes, extravagantes, atordoantes e venenosos, um obeso baixo mareado a linhas meneantes, sombreadas, tonificadas e magnetizantes, uma eloquente bateria de toque divertido, vivo, solto e descontraído, e uma melodiosa voz de tonalidade aveludada, amarelada, diabrina e avinagrada. São 40 minutos de fácil digestão, prazerosa comoção e imediata fascinação. Este é um álbum imensamente viciante. Saboreiem sem moderação esta irresistível e afrodisíaca destilação de puro malte, e vivenciem com inesgotável satisfação a auspiciosa e afirmativa estreia da turma escandinava.

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Review: 🌵 Centre El Muusa - 'Purple Stones' (2022) 🌵

★★★★

Dois anos corridos depois de lançado o seu homónimo álbum de estreia (aqui trazido e elogiado), o quarteto estónio Centre El Muusa descortina agora o seu segundo trabalho de longa duração intitulado ‘Purple Stones’ e promovido pelo influente selo discográfico germânico Sulatron Records nos formatos físicos de CD e vinil (ambos limitados a uma prensagem de 500 cópias existentes cada). Incensado por um cativante, idílico, xamânico e deslumbrante Country Rock de envolvência Western, um ensolarado, colorido, descontraído e açucarado Psychedelic Rock de orientação astral, e um arejado, enfeitiçante, dançante e condimentado Krautrock de aroma oriental, este novo registo da jovem formação enraizada no leste europeu desdobra no imaginário do ouvinte todo um adornado tapete desértico, onde se espreguiçam majestosos Saguaros, vagueia uma apaladada brisa, e se debruça sobre as imponentes montanhas que recortam o horizonte um lisérgico Sol de bafo morno e palpável. De olhar semi-selado, espírito aureolado, visões caleidoscópicas, sensações ataráxicas e corpo demoradamente troteado por um cavalo cansado que percorre as douradas areias de um interminável deserto farolizado a luzência crepuscular, somos engolidos, nutridos e embalados pela etérea, nirvânica e anestésica sonoridade de ‘Purple Stones’. Todo um reconfortante oásis banhado a mescalina que nos viaja – de membros massajados e sentidos adormecidos – pela sempiterna espiral de uma inescapável hipnose. Na composição deste narcótico fármaco gravitam entre si uma guitarra Mariachi de Riffs cativantes e solos uivantes, um baixo hipnotizante de linhas distendidas e ondeantes, uma absorvente bateria de batida entretida e constante, e ainda harmoniosos teclados de swing jazzístico e mugidos cósmicos. Esta é a banda sonora perfeita para emoldurar finais de tarde veraneios, de corpos recostados, pele bronzeada e cerveja gelada empunhada. Deixem-se velejar ao prazeroso sabor das lenitivas, quentes e contemplativas vibrações emanadas pelo balsâmico exotismo de Centre El Muusa, e permitam-se adormecer soterrados nas insondáveis profundezas da doce letargia.

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 Sulatron Records

Review: 💥 Ambassador - 'Insatisfacción' (2022) 💥

★★★★

Herdeiro do imortal legado deixado pelo icónico guitarrista argentino Pappo, o bombástico power-trio Ambassador acaba de detonar o seu terceiro álbum ‘Insatisfacción’ e as ondas de choque daí resultantes embateram em mim com grande impacto. Lançado em formato digital – ainda que com uma edição física calendarizada para um futuro próximo – este novo trabalho de longa duração forjado pelo tridente sediado na cidade-capital de Buenos Aires vem munido de um inflamante, libidinoso, vigoroso e vibrante Heavy Blues de evocação setentista e indiscreta influência de Pappo’s Blues, efervescido num enérgico, delirante, excitante e caleidoscópico Heavy Psych de vistosa musculatura Hard Rock a transudar Motörhead. A sua sonoridade vincadamente elegante, fluída, entusiasmada e retumbante – baloiçada numa desarmante simbiose entre destravadas galopadas de esporas ensanguentadas e alucinadas passagens de toxicidade a perder de vista – provoca no ouvinte todo um vulcânico rebentamento de adrenalina que o sobreaquece e estremece do primeiro ao derradeiro tema. Nas rédeas desta selvática locomotiva de olhar fulminante e narinas fumegantes estão uma dominante guitarra de pesados, escaldantes, bamboleantes e lubrificados Riffs – manobrados a trevosas ressonâncias Black Sabbath’icas – de onde relampeiam solos serpenteantes, ácidos, endiabrados e trepidantes, um nervudo baixo de balanço meneante, dirigido a linhas dançantes, volumosas, flexíveis e hipnotizantes, uma estimulante bateria soberbamente desembaraçada a acrobacias precisas, expressivas, lépidas e incisivas, e vocais timoneiros de tez escarpada, felina e rouquenha – que ficam a meio caminho entre a limpa e sóbria voz do próprio Pappo e a abrasiva aspereza vocal do lendário Lemmy Kilmister – que troteiam esta ventosa e implacável manada de fervor e vigor movediços. Na condição de instrumentos convidados e num plano secundário – no que à duração da sua manifestação diz respeito – perfilam-se ainda um espaventoso saxofone de acrimoniosos, furiosos, excêntricos e fantasmagóricos sopros, um arrepiante slide que exorciza a guitarra e dela arranca esvoaçantes e uivantes lamúrias trazidas do lado mais rústico e poeirento do velho Blues, e ainda um carismático órgão Hammond de aquosas, frescas, aromáticas e gloriosas melodias. Este é um álbum de fácil digestão e imediata fascinação que decerto conquistará não só todos os puristas do Blues tradicional, como também todos aqueles que não prescindem de acrescentar umas sofisticadas pitadas de modernidade à receita original.

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Review: ⚡ Cardiel - 'El Armagedón Afterparty' (2022) ⚡

★★★★

Nativo da Venezuela, mas formado na densamente populosa capital Cidade do México, o bombástico e irreverente power-duo Cardiel está finalmente de regresso – cinco anos volvidos sobre o lançamento do seu empolgante EP ‘Aloha From Fuzz’ (aqui descrito) – com o intratável registo de longa duração ‘El Armagedón Afterparty’ que saíra hoje mesmo à rua com o carimbo editorial do selo azteca LSDR Records através dos formatos digital e CD (este último limitado a 300 cópias disponíveis). Fervida num revoltoso, alucinógeno e fogoso Skate Rock de alta voltagem psicadélica, vigiado de perto por carregadas, enlutadas e despóticas nuvens Doom’escas, com intensos acessos de incontrolável fúria Punk Rock, e que ocasionalmente desagua nas veraneias praias de um dançante Dub de aroma tropical e transe espiritual, a vibrante, exótica e contagiante sonoridade de Cardiel agiganta todo um mastodôntico tsunami de endorfinas que em nós rebenta sem qualquer misericórdia. Condimentado por um clima camaleónico que alterna entre a vulcânica euforia e a ataráxica acalmia, ‘El Armagedón Afterparty’ simboliza todo um paradisíaco retiro de afago sensorial que procura curar todas as feridas perpetradas pela pandemia que ainda perdura. Desbravado por uma selvática, ritmada e entusiástica bateria de baquetas em chamas, uma ciclónica guitarra – consumida pelo ácido e abrasivo efeito Fuzz – que conduz imperiosos, psicotrópicos e tumultuosos Riffs de onde são vertidos solos delirantes, azedados e borbulhantes, e uma voz gritada a corrosiva, opressiva e urticante potência, este novo álbum dos venezuelanos sediados em solo mexicano detona toda uma pujante efervescência que nos sobreaquece e enlouquece. Ainda bem viva na minha memória está a irrepreensível performance deste dueto radical na última edição do festival SonicBlast (aqui narrada) que transformara o lotado palco da piscina num fumegante caldeirão em total ebulição. Deixem-se bronzear pelas provocantes, prazerosas e incessantes vibrações difundidas pelos sísmicos Cardiel, e vivenciem-nos em polvorosa.

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 LSDR Records

Review: 💫 Hällas - 'Isle of Wisdom' (2022) 💫

★★★★

Os druidas suecos Hällas estão de regresso com o seu muito aguardado novo álbum ‘Isle of Wisdom’, oficialmente lançado hoje mesmo a duas mãos através da influente companhia discográfica austríaca Napalm Records e da ainda pouco expressiva editora local RMV Grammofon nos formatos digital, CD e vinil. Replicando e aplicando a ganhadora fórmula que celebrizara os seus registos antecessores, ‘Isle of Wisdom’ é oxigenado por um melódico, ostentoso, aparatoso e epopeico Hard Rock forjado à boa e velha moda dos britânicos Wishbone Ash, e um místico, ritualístico, onírico e deslumbrante Progressive Rock sintonizado na mesma frequência dos clássicos Genesis. A sua sonoridade de nostálgica evocação setentista, aguçada veia romancista e índole quimérica, esotérica e imperial descortina no nosso imaginário toda uma envolvente, apaixonante e fabular narrativa desenrolada num palco medieval com vista para a eterna noite astral. De escudos firmemente empunhados e espadas desembainhadas – de lâminas alumiadas pelo pálido brilho lunar – estes templários escandinavos prosseguem a sua triunfante cruzada pelos sangrentos capítulos de uma guerra religiosa principiada e sustentada pela malvadez de uma rainha tirânica. Na sublime dissertação destas lendárias aventuras e desventuras superiormente arranjadas e musicadas, perfilam-se duas guitarras siamesas que se engrandecem na vistosa e galvanizante ascensão de vultosos, principescos, altivos e imperiosos Riffs, e redemoinham na caprichosa e alucinante condução de majestosos, virtuosos, épicos e tortuosos solos, uma voz profética de pele amarelada, sóbria, aveludada e aristocrática, sombreada de perto por um luminoso e sideral coro vocal, um baixo ufano de bafejos elásticos, densos, tensos e magnéticos, um exuberante sintetizador de idílica natureza SCI-FI que – com a sua feitiçaria electrónica e serpenteios bruxuleantes – perfuma e embruma toda esta sonhadora atmosfera de uma ofuscante pulverescência estelar, e ainda uma bateria atlética que – com vivaz, tenaz e acrobática precisão – tiquetaqueia e troteia todas as desiguais paisagens deste heroico ‘Isle of Wisdom’. Este é um álbum verdadeiramente erudito, inaudito e fantasista, detentor de uma desarmante opulência, aprumada sapiência e inebriante concupiscência, que nos absorve e comove do primeiro ao derradeiro tema. Deixem-se enamorar e conquistar pela soberana e magnificente extravagância de uma banda aureolada a uma miraculosa beleza que, não só não desilude, como continua a surpreender e embevecer todos aqueles que, tal como eu, a comungam e reverenciam desde a sua criação.

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 Napalm Records
 RMV Grammofon