sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Om | Gabriel Ferrandini

















Al Cisneros guia o riff tal como o riff guia Al Cisneros. Esses são os benefícios próprios de quem passou uma grande parte da vida, com um baixo nas mãos, a sustentar o andamento vagaroso de verdadeiros monumentos musicais, que definiram o que seria o stoner. Ao lado de Matt Pike e Chis Hakius, nos lendários Sleep, Al Cisneros participou numa libertação que só poderia ter partido de três jovens inspirados pelas longas distâncias da Califórnia: dilatar a genética dos Black Sabbath, anestesiá-la com quantidades impróprias de marijuana e colher, como resultado, o rock enquanto “trip” sem fim. Foi essa vocação que levou os Sleep ao marco “Holy Mountain” e, mais tarde, ao manifesto “Dopesmoker”. A grandiosidade do último acabou por originar um conflito entre os Sleep e a London Records, que se recusou a lançar o disco na sua forma monolítica, de uma só faixa com mais de 60 minutos. Indispostos a ceder perante a vontade da indústria, os Sleep dissolveram-se e Al Cisneros ficou com as mãos livres para os OM.
.
Em comparação com as anteriores incursões de Cisneros pelo stoner, os OM destacam-se por uma mais livre assimilação das sonoridades do oriente (desde as ragas indianas aos recorrentes cânticos do Tibete). Stoner de infusão. Apesar de ter sido recebido com alguma frieza, o último “God is Good” provou ser bastante capaz de aliar os habituais colossos com outros pequenos pagodes das arábias, da mesma forma que o anterior (e mais enaltecido) “Pilgrimage” já havia encontrado o equilíbrio certo entre estados de contenção e de ofensiva rítmica. Nesta digressão, os OM apresentam-se como um trio formado por Al Cisneros, Emil Amos (nómada da bateria e figura especialmente intrigante nos últimos anos de música) e Rob “Lichens” Lowe (que, além de tocar teclado e guitarra, deve contribuir também para as vozes). A data em Lisboa é naturalmente imperdível e cinco mil “head-bangers” não podem estar enganados.

Miguel Arsénio

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

Yawning Man

Yawning Man was the sickest desert band of all time. You’d just be up there in the desert, everybody’d just be hanging, partying. And they’d show up in their van and just, mellow, drag out their shit and set up right about the time the sun was goin’ down, set up the generators, sometimes they’d just go up there and drink beers and barbecue. Sometimes it would be a scene; sometimes it would be very intimate. It was very casual and loose and everybody would like, while they’re playing, everyone would just lounge around. They were kinda like a house band. It wasn’t militant like Black Flag. It was very drugged, very stone-y, it was very mystical. Everyone’s just tripping, and they’re just playing away, for hours. Oh, they’re the GREATEST band I’ve ever seen. 

Brant Bjork

sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

Queda Livre

Descalça, aproximou-se da longa vidraça e afastou as pesadas cortinas que impediam os seus olhos de voar. Encalhou o olhar no solo desfocado e luminoso de Tóquio, e sentiu o seu corpo repelir-se pelas inúmeras ruas que fluíam para o pecado. Uma voz perfumada de autoridade elevou-se nas suas costas, e o seu olhar regressou à distinta janela. O seu irmão mais velho perguntou-lhe se queria acompanha-lo, mais uns amigos, numa jornada nocturna de diversão asiática. Os seus cabelos gesticularam num sinal concreto de negação, e ele fechou a porta e saiu. As denúncias amordaçadas abraçaram-na. Sentiu-se em queda livre. O seu corpo despido e pesado caía, caía e caía… E ela observava-o cair.

domingo, 16 de janeiro de 2011

Cinema de Janeiro (1/2)

The Brown Bunny (2003) de Vincent Gallo
Ugetsu Monogatari (1953) de Kenji Mizoguchi
My Queen Karo (2009) de Dorothée Van Den Berghe
True Grit (2010) de Ethan Coen & Joel Coen
The Wrong Man (1956) de Alfred Hitchcock
Fargo (1996) de Joel Coen
El Ángel Exterminador (1962) de Luis Buñuel
127 Hours (2010) de Danny Boyle
Carlito’s Way (1993) de Brian De Palma
De Helaasheid der Dingen (2009) de Felix Van Groeningen

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Roscoe Street, Chicago

De repente as minhas pálpebras abriram-se. Acordei num universo de escuridão, onde a tua tranquila respiração se fundia com o som da chuva que caía lá fora. Não sei o que suspendeu o meu sono de forma tão gritante... Num esforço calado, arrastei a cabeça pela almofada, de forma a encontrar-me na escuridão daquela noite. 05:10h – anunciava o relógio de dígitos luminosos. Levantei,  suavemente, o  vértice do lençol que cobria os meus ombros e saí da cama. A tua respiração compassada e serena prosseguia noite dentro. Aproximei-me da janela, e pelas frinchas da persiana pude ver a rua desolada que jazia abaixo do meu quarto. Os candeeiros de iluminação pública estavam intermitentes e a chuva acelerava o seu cortejo suicida em direcção ao solo. Ouviam-se desacatos provenientes de um pub situado no fundo da rua. As garrafas partiam-se e catapultavam consequentes palavras de guerra que encorajavam os presentes à disputa. Não fosse a chuva a impedir a propagação sonora do iminente apogeu da violência, e as forças policiais já estariam no local para acalmarem os ânimos e fazerem detenções. Assim sendo, toda a rua dormitava nos seus leitos de inconsciência aprazível. A presença tão audível da tua respiração anestesiou os meus ombros. Ela parece divulgar a perenidade da tua vida. Apenas da tua vida! Pois quanto à nossa união, avizinha-se um longo processo litigioso de separação, que as nossas palavras e posições tão condescendentes não conseguiram impedir. Quando isso acontecer, talvez corra a um bar e me embebede até que as pesadas mãos da ebriedade sufoquem o débil pescoço da lucidez.