Baterista por predefinição –
mais comummente reconhecido pelo seu trabalho de baquetas empunhadas ao serviço
de Fast Eddie Nelson – o músico português Nuno Carromeu decidira olhar-se
ao espelho, acumulando e canalizando toda a sua inspiração musical para o seu
primeiro projecto a solo apelidado de Benguela Blues Connection, e –
devo antecipar sem demoras – o resultado do mesmo não poderia ser mais do meu
agrado. Lançado muito recentemente pela já afamada editora discográfica lusitana
Raging Planet sob a forma física de vinil (reduzido a uma prensagem ultra-limitada
de apenas 300 cópias existentes), este magnífico álbum de designação homónima simboliza
o ponto de encontro entre um elegante, rústico, radiofónico e serpenteante Blues-Rock
de orientação revivalista e paladar Jimi Hendrix’eano, um edénico,
envolvente, atraente e messiânico Desert Rock à boa e velha moda de ‘Jalamanta’
(Brant Bjork, 1999) e ainda um dançante, carnavalesco, fogoso e empolgante Zamrock
de calor e odor africanos, criando assim todo um exótico, aromático e irresistível cocktail
sonoro que prontamente me colocara os ouvidos em constante salivação. Senhorio
de todos os instrumentos que se entrelaçam e harmonizam em eloquentes diálogos
entre si, Nuno Carromeu pode muito bem orgulhar-se da veraneia sonoridade
por ele pensada e tricotada, que de forma tão agradável se passeia e galanteia pela longevidade
deste álbum de rica e singular personalidade. Ao volante de uma endeusada guitarra que se envaidece em uivantes, alucinógenos, bronzeados e delirantes acordes, um baixo Funky
& Groovy de linhas ondulantes, eróticas, torneadas e
hipnotizantes, uma soberba bateria jazzística de ofegante galope tribalista e toque desembaraçado, cintilante,
provocante e inspirado que tiquetaqueia e capitaneia todo o álbum com
desarmante perícia, ousadia e sensibilidade, e ainda uma passageira voz de textura megafónica
que ecoa pelas calejadas e ensolaradas paisagens de ‘Benguela Blues Connection’,
somos embalados das idosas margens do rio Mississippi onde o carismático
Delta-Blues fora lavrado, exorcizado e hasteado, até uma sagrada peregrinação
desértica – acima de aveludadas, arenosas e amorenadas dunas e debaixo das
fervilhantes e vibrantes lufadas suspiradas por um intenso e vigilante Sol que
se debruça no firmamento – de destino apontado a um verdadeiro oásis onde a
nossa alma se esbate, banha e deleita. De estender também as mais elogiosas
palavras ao impactante artwork – a fazer recordar o mítico trabalho
visual do pintor alemão Mati Klarwein que confere rosto ao histórico e
revolucionário registo ‘Bitches Brew’ (Miles Davis, 1970) –
superiormente ilustrado pelo talentoso artista português Ricardo Reis e
onde os nossos olhos mergulham e naufragam por entre a estonteante profusão de
cores e a conjugação de elementos. ‘Benguela Blues Connection’ é um álbum ritualista
de sublimada e consumada beleza que nos afaga todos os sentidos e eteriza a
alma num inebriante estádio de profundo relaxamento. Não vai ser fácil
despertar deste paraíso de indução auditiva que nos massajara e consagrara ao
longo dos 38 minutos que balizam o primeiro e o derradeiro tema. Um primoroso e
caprichoso registo – detentor de uma aliciante aura meditativa e profética – que apressadamente
nos converte em seus devotos discípulos. Estamos indubitavelmente na presença
de um dos mais veneráveis discos do ano que promete batalhar de forma aguerrida por um dos lugares
mais invejáveis da listagem final onde estarão perfilados e medalhados os
melhores álbuns de 2019.
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