Da pequena ilha de Guernsey
– situada no Canal da Mancha, entre o território inglês e francês – chega-nos ‘Ataraxy’,
o novo e segundo álbum – e o meu registo favorito até à data – do trio Brunt.
Oficialmente lançado no último suspiro do passado mês de Novembro, exclusivamente
em formato digital e de crédito autoral – ainda que com a garantia deixada pela banda de um futuro
lançamento em vinil – este adorável registo de Brunt faz inteiramente jus
ao nome que o mesmo enverga. Baseado num delicado, cinematográfico e sublimado Post-Rock
polvilhado e perfumado a um primaveril psicadelismo que discretamente se
desenvolve, agiganta e revolve num inflamante, vigoroso e empolgante Desert
Rock enlameado num pantanoso Psych Doom de águas espessas e paradas,
‘Ataraxy’ perfila-se como um dos trabalhos de longa duração mais
prazerosos do ano. Integralmente desdobrado à boleia de um envolvente,
hipnótico, evolutivo e eloquente diálogo entre os três instrumentos-base, ‘Ataraxy’
tem a capacidade de florescer e estabelecer na alma do ouvinte um inamovível
estádio de perfeita tranquilidade, massajando e afagando o seu cerebelo, e climatizando
e inebriando todos os seus membros e sentidos ao longo dos 34 minutos de
duração. A sua sonoridade imensamente edénica e visual edifica no nosso
imaginário toda uma deslumbrante narrativa utópica da qual não queremos
regressar. De corpo inanimado e espiritualidade mergulhada no atmosférico,
meditativo e lisérgico universo de Brunt, somos iluminados, banhados e canonizados
pela etérea maviosidade destilada por uma guitarra enternecedora de imperturbáveis,
doces, sensitivos e afáveis acordes, e gritantes, gélidos e delirantes solos que
ecoam pela infinidade espacial, para de seguida nos enlutar, atemorizar e
sepultar numa misantrópica narcose amuralhada pelos seus umbrosos, melancólicos,
monolíticos e rumorosos Riffs de ressonâncias Black Sabbath’icas,
um baixo pulsante, magnético e murmurante de pausada, densa, obscura e
tonificada reverberação, e uma catártica bateria de ritmicidade libertadora e
estimulante que nos mantém de olhar arregalado e cabeça pendulante do primeiro
ao derradeiro tema. É-me ainda importante reverenciar o encantador artwork
brilhantemente ilustrado pelo artista Eric Krick, que de forma
irretocável e imaginativa estendera toda a mágica beleza sonora de ‘Ataraxy’
para o universo visual. Este é um álbum purificante que tanto nos encandeia de esperançosa
luminosidade como nos eclipsa de um soturno negrume. Deixem-se enfeitiçar pelo
fabular mistério que emoldura ‘Ataraxy’ e vivenciar com detida
entrega e sentida devoção um álbum lapidado a capricho, subtileza e emoção.
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