segunda-feira, 23 de março de 2020

Review: ⚡ Canyon - 'EP III' (2020) ⚡

Os norte-americanos Canyon acabam de publicar um comunicado que provocara em mim uma acesa disputa entre sentimentos contraditórios. Se o imediato lançamento de um novo EP incendiara o rastilho do meu entusiasmo, o triste e inesperado anúncio de um hiatus de duração indefinida deixara-me com um ainda ligeiro travo a nostalgia que o futuro se encaminhará de intensificar com o amadurecer do tempo. Sem mais demoras, vou avançar para o que de melhor esta talentosa banda natural da cidade de Filadélfia (Pensilvânia, EUA) deixara imortalizada na memória: a sua curta, mas rica discografia. ‘EP III’ é o nome dado ao último capítulo do legado discográfico deixado pelo jovem power-trio de nomenclatura clássica e uma leal dedicação – transformada numa inspirada reencarnação – ao que de melhor desabrochara no fértil solo das douradas décadas de 60 e 70. Sustentado e regrado por uma sagrada aura de feição e aroma revivalistas, e muito recentemente disponibilizado para escuta integral, numa exclusiva edição de autor em formato digital – com a sempre elogiável possibilidade de download gratuito – através da sua página de Bandcamp oficial, este derradeiro e imaculado EP de Canyon vem ungido, condimentado e chamejado por um elegante, apurado, sublimado e empolgante Heavy Blues de estirpe setentista, engrenado num irreverente, alucinógeno, erógeno e ardente Acid Rock trazido da segunda metade da boémia década de 60, e num fervilhante, dinâmico, bombástico e electrizante Heavy Psych de berrantes e impactantes erupções. Baloiçado entre turbulentos momentos de euforizante efervescência e nirvânicas passagens de delirante dormência, ‘EP III’ atesta e extravasa de incontáveis virtudes os vinte minutos que o balizam. Capitaneado por uma majestosa guitarra de essência Led Zeppelin’esca que se envaidece na criativa elaboração de charmosos, cativantes, triunfantes e alterosos Riffs urtigados pelo efeito Fuzz, e se enraivece na virtuosa ejaculação de exuberantes, labirínticos, furiosos e atordoantes solos, um baixo bafejante, ondulado e pulsante de sinuosas linhas desenhadas a negrito, uma apaixonante bateria de alma circense que se manifesta com base em desembaraçadas, aparatosas, engenhosas e apressadas acrobacias, e ainda uma voz de tez rugosa, felina, mélica e melodiosa – depositária de dotes que prontamente nos remetem para o emblemático Robert Plant – que confere a este admirável registo toda uma simétrica e aristocrática graciosidade. Amotinado pelas revoltosas e fogosas águas da comoção, e desaguado nas paradisíacas e oníricas praias de um ofuscante transe espiritual, alcanço o glorioso final de um precioso registo que resvala nas costuras da perfeição. Muito dificilmente existiria melhor forma dos Canyon se despedirem de todos os seus ouvintes. ‘EP III’ afigura-se como um dos mais sérios candidatos a EP do ano. Na pesada ressaca em mim deixada pelo mesmo fica um discreto gosto a saudade de um tridente inesquecível ao qual seguramente recorrerei vezes e vezes sem conta.

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