segunda-feira, 30 de março de 2020

Review & Full Premiere: ⚡ Moura - 'Moura' (2020) ⚡

Da vizinha Espanha – mais concretamente da cidade galega de Corunha – chega-nos um dos trabalhos mais ansiados e surpreendentes do ano. ‘Moura’ é o magistral álbum de estreia – de designação homónima – esculpido e lapidado pelo talentoso e sui generis quinteto espanhol que verá a luz do dia no próximo dia 1 de Abril (quarta-feira) através do conceituado selo discográfico local Spinda Records na forma física de CD e vinil (ambos os formatos ultra-limitados à existências de parcas centenas de cópias disponíveis para venda). Respondendo positivamente ao dignificante convite que me fora feito para estrear – de configuração exclusiva – em solo (digital, entenda-se) português a escuta integral desta prodigiosa primeira obra discográfica de Moura, é ainda assombrado por um febril entusiasmo – deixado pelo mesmo – que tentarei da forma mais genuína transladar para o domínio textual tudo aquilo que ‘Moura’ em mim ateara no universo emocional. Concebido e conservado por um devocional, outonal, novelesco e tradicional Folk de aura ritualista que desenterra e ressuscita toda a esquecida mística do paganismo celta, e um exuberante, enigmático, magnético e apaixonante Heavy Prog – matizado a um efervescente psicadelismo – de contornos épicos e estirpe revivalista, este sublimado ‘Moura’ presenteia e prazenteia o ouvinte com requintadas, deslumbrantes e inspiradas composições musical e liricamente desafiadoras. De olhar envidraçado, semblante pasmado e espírito enfeitiçado, somos cativados e orientados por uma esotérica liturgia – superiormente liderada por estes cinco druidas – de oração e adoração apontadas ao revivalismo de lendas ancestrais. Absorvidos e nutridos por um profundo e intenso transe religioso, é-nos demasiado fácil converter em devotos peregrinos de duas guitarras messiânicas que se hasteiam em ostentosos, faraónicos, mitológicos e imperiosos riffs, e se inflamam em delirantes, exóticos, tóxicos e uivantes solos, um vultoso baixo de pesada, densa, tensa e ondulada reverberação, um maravilhoso órgão Hammond de hipnotizantes, enigmáticos e transbordantes bailados, um mágico sintetizador que nos empoeira e beatifica de profecias cósmicas, uma sofisticada bateria de natureza erudita e galope tribalista que tiquetaqueia todo o álbum com a sua apurada técnica, e uma voz evangélica que – perseguida por um populoso, ecoante e luminoso coro vocal – capitaneia esta quimérica digressão pelos primórdios da preciosa cultura galega. A bonita fotografia que adorna o rosto deste imaculado registo tem os seus devidos créditos apontados ao fotógrafo espanhol Leo López. De destacar ainda a inclusão da assombrosa versão cover do tema "A Ronda das Mafarricas" originária do nosso Zeca Afonso, que encerra na perfeição toda esta fabulosa digressão pelos meandros de mitos, costumes e ritos antepassados. Este é um álbum verdadeiramente utópico. Um irrepreensível trabalho arquitectado e executado a desarmante maestria que me nutrira, seduzira e conquistara do primeiro ao derradeiro tema. ‘Moura’ garante – assim – não só uma estreia profundamente marcante, como um lugar cativo por entre os mais premiados e elogiados álbuns que representarão os melhores discos de 2020. Estes cinco eremitas hispanos vêm comprovar que nem só dormindo, sonhamos. Corações ao alto, o nosso coração está em Moura.


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