Devo começar
por confessar que sempre que a produção de um novo álbum de Graveyard é
noticiada, desejo secretamente que a mesma esteja a ser tricotada com as mesmas
linhas que desenharam e trajaram o primeiro álbum (que é, de longe, o meu
favorito) da consagrada banda sueca, mas essa expectativa tem sido continuamente
defraudada desde o lançamento do seu terceiro álbum ‘Lights Out’ de
2012. Por isso, os cinco degraus discográficos de Graveyard têm representado
– para mim – uma escadaria que percorro no sentido descendente (no que ao meu
grau de satisfação nutrida pelos escandinavos diz respeito). Depois de um
período de cinco anos de jejum – que se seguira após o álbum ‘Peace’ de
2018 – os Graveyard regressam agora com um novíssimo álbum debaixo do
braço (mais concretamente, e como o respectivo título assim sugere, o seu sexto
registo de longa duração), publicado pela mão da poderosa companhia
discográfica germânica Nuclear Blast nos formatos físicos de LP e CD. Já
um tanto órfão da moribunda esperança de ver Graveyard dar continuidade
à quente, áspera e atraente sonoridade do seu irretocável registo homónimo de intrigantes
ares Witchcraft’eanos e, de certa forma, até conformado com essa tendência aparentemente irreversível, embarquei, sem bússola e de velas içadas ao
sabor do vento, nas grisalhas e encaracoladas águas de ‘6’ de mente completamente
desanuviada, disposto a absorver tudo aquilo que esta obra tem a dizer. E se
depois de uma primeira audição senti haver ali algo que não me permitia
desistir dele, com o acumular de renovadas explorações esse sentimento de apego
foi amadurecendo e crescendo, culminando no exacto momento em que redijo estas sinceras
e enamoradas palavras a ele dedicadas. Pendulando entre chuvosas, ternas e lamentosas
baladas – delineadas a um inefável requinte que nos respira e condimentadas a
uma permeabilidade emocional – que afagam o nosso desgosto e devem ser
comungadas para lá do Sol posto, e ritmadas, curtas e apimentadas galopadas que
fervilham em lume brando e nos surpreendem pela ousadia de perturbar aquele
anestésico estado de etérea bonança que governa a maior fatia do seu espaço temporal, ‘6’
é um apaixonante registo de feições adultas e vestes outonais que ostenta o
melhor lado daquele que considero ser o lado menos apelativo de Graveyard.
É o agasalho perfeito para noites frias, melancólicas, de olhar nostálgico e
ouvidos acordados pelo uivo da coruja. A sua sonoridade trovadora, refinada,
caramelizada e conquistadora, por onde escorrem sentimentos genuínos que contagiam
os nossos, passeia-se livre e graciosamente pelos meandros de um elegante,
nocturno e aconchegante Blues Rock de roupagem clássica, um acalorado, odoroso
e torneado Hard Rock de moldura vintage e até de um deslumbrante,
lascivo e purificante Soul de luzência seráfica. De personalidade
bipolar, onde de um lado é mostrada a suavidade, doçura e ligeireza, e do outro
a rugosidade, amargura e diabrura, ‘6’ floresce e colora bonitas
composições sulcadas por duas guitarras de tonalidade quente que se entrelaçam
em acordes bailantes, majestosos e cativantes, e desenlaçam em solos esguios, serpenteantes
e luzidios, um baixo movediço de pulsação estética, magnética e ondeante, uma deliciosa
bateria – acrobática e expressiva – de tambores galopantes e pratos flamejantes,
um garboso piano de teclas saltitantes, melodiosas e tocantes, e liderantes vocais
tanto felinos, fogosos e urticantes, como límpidos, amaciados e melosos. Este é
álbum adornado a primor que vive do detalhe e da sensibilidade. Um registo que
mistura sorrisos e lágrimas, detentor de uma secreta beleza que só com o
acumular de variadas audições se descobre e apalada por inteiro. Uma obra que
nasce do lado mais romancista, reflexivo e intimista de Graveyard, reside
na penumbra, e deixa no lado lunar do ouvinte pequenos rastilhos de luz e esperança.
Este é o mais franco testemunho de quem acaba de ser reconquistado por uma
banda que outrora tudo lhe deu e daqui em diante – acredito – continuará a dar.
Um dos álbuns mais enternecedores do ano está aqui. Refugiem-se nele.
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