A espera terminou e a ânsia esvaziou. Depois de
algures no já distante ano de 2015 ter conhecido, experienciado e
consequentemente salivado o fabuloso EP de estreia do quinteto
norte-americano Dead Feathers (fixado em Chicago, Illinois),
hoje foi finalmente lançado o seu primeiro trabalho de longa duração e eu não
poderia ter avançado para a sua escuta integral com maior dose de entusiasmo e
motivação. Promovido pelo imparável selo discográfico californiano Ripple
Music sob a forma física de CD e vinil, ‘All is Lost’
presenteia o ouvinte com um refrescante, mélico, edénico e afagante Psych
Rock que tanto se aquieta, suaviza e eteriza num admirável, idílico e
apaixonante Folk de fascinante narrativa campesina, como se metamorfoseia,
engrandece e obscurece num pantanoso, vagaroso, narcotizante e sonolento (no
sentido elogioso da palavra) Heavy Psych à boa moda de Dead Meadow.
A sua sonoridade de beleza sublimada, apurada e consumada – que se espreguiça
do carismático território revivalista ao mais contemporâneo – remete o ouvinte
para um deslumbrante universo visual onde tímidos raios solares pincelam de luz,
desvendando cuidadosa e paulatinamente todos os contornos da bucólica e nebulosa
madrugada que climatiza uma orvalhada paisagem outonal, tingida e envelhecida a
sépia. Embriagados de uma maviosa e caramelizada melancolia que nos massaja todos
os membros e sentidos, somos forçados a ceder perante a dominante gravidade
exercida por ‘All is Lost’ que nos envolve, enfeitiça e sepulta nas
vertiginosas profundezas de uma quimérica ambiência onírica. De pálpebras tombadas,
cabeça baloiçante e corpo dormente, somos hipnotizados, mumificados e embalados
numa prazerosa letargia tricotada por duas encantadoras guitarras de afectuosos,
anestésicos, delicados e harmoniosos acordes dedilhados e condimentados a pura e
estarrecedora formosura, que indiscreta e progressivamente se avolumam e
sombreiam em poderosos riffs de onde florescem e se envaidecem uivantes,
ácidos e intoxicantes solos, uma cativante bateria que evolui de uma leve e
intimista percussão de natureza tribalista e ritualista para desenfreadas e
desembaraçadas galopadas incendiadas a empolgamento, um murmurante baixo de reverberação
conduzida a linhas pulsantes, flexíveis, magnéticas e dançantes, e capitaneada
por uma tonificante e aliciante voz feminina de tez charmosa, melódica, aveludada
e fibrosa que se hasteia, glorifica e pavoneia com destacada lubricidade. De louvar
ainda o fantástico artwork – superiormente ilustrado pelo facilmente
identificável e de talento inesgotável Adam Burke – que confere toda uma emblemática misticidade visual a este irresistível ‘All is Lost’. Tanto dele esperava e tudo ele me trouxe. Este álbum de estreia de Dead
Feathers representa o alcançar de um imaculado estádio de espantosa maturação
que desculpa todos estes anos remetidos ao silencioso jejum discográfico. ‘All
is Lost’ é um álbum deveras arrebatador que nos corteja do primeiro ao
derradeiro tema. São 48 minutos completamente absorvidos por uma desarmante e purificante melosidade que nos enleva sem qualquer timidez. Um registo atestado de uma refinada inspiração que me impactara e conquistara
de forma muito singular. Estamos mesmo na presença de um dos mais aprumados
discos nascidos em 2019. Banhem-se neste balsâmico néctar sonoro e vivenciem com
toda a entrega e devoção um dos álbuns (por mim) mais aguardados dos últimos
anos.
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1 comentário:
Motivado pelo texto procurei o álbum no streaming do Tidal e estou começando a ouvi-lo agora. Primeira impressão ótima. Se não fosse pelo blog jamais saberia da existência. Não é o tipo de álbum que frequenta as publicações de música popular mundo agora. Obrigado.
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