Da cidade de Rockford
(localizada no estado norte-americano do Illinois) chega uma das mais
agradáveis surpresas sonoras de 2019. ‘Perfect Dark’ é o segundo
e novo álbum do quinteto White Shape que fora lançado no início do
presente mês de Setembro sob a forma física de vinil pela mão da editora
discográfica americana Little Cloud Records (com distribuição europeia através
da Cardinal Fuzz, e australiana pela Psychedelic Salad). A sua
sonoridade etérea conjuga um reconfortante, plácido, ensolarado e deslumbrante Psych
Rock com um mágico, envolvente, anestésico e quimérico Shoegaze de
pura beleza onírica. De membros paralisados, sentidos adormecidos e totalmente
rendidos a esta morfínica infusão, somos banhados e embalados por uma mélica, profunda e melancólica
narcose que nos iça na vertiginosa direcção de um Cosmos bocejante. Abraçados e sedados pela
prazerosa obscuridade de ‘Perfect Dark’ despertamos num
imperturbável estado de bem-estar que nos fascina e climatiza do primeiro ao derradeiro
tema. São 52 minutos embebidos numa entorpecedora e libertadora sublimidade de
coloração utopista que nos faz deslizar as pálpebras pelo olhar envidraçado, tombar
a pesada, sonolenta e embrumada cabeça sobre o peito e sepultar nas mais íntimas
profundezas da introspecção. Uma sidérica, embriagada e edénica hipnose que nos
eteriza e canaliza pelas zonas mais secretas e erógenas da espiritualidade, e
de onde não mais desejamos emergir. Percam-se na mística, divina e encantadora resplandecência
farolizada pela ofuscante escuridão de ‘Perfect Dark’, e
encontrem-se de alma integralmente relaxada e massajada ao sabor de uma
pacífica, suave e lisérgica ondulação. Na composição deste poderoso opiáceo de absorção
auditiva está uma endeusada voz feminina de textura delicada, enternecedora, sonhadora
e imaculada (que prontamente me fizera recordar a célebre Dolores O'Riordan,
voz de The Cranberries) que – de forma subtil e delicada – sobrevoa e
ecoa pela harmonia estelar vaporizada por um mágico teclado / sintetizador,
criador de uma intrigante envolvência alienígena, pelo esponjoso experimentalismo
tricotado por uma hipnótica guitarra de tocantes, embelezados, esmerados e enfeitiçantes
acordes, e atordoantes, ácidos e alucinantes solos de elevada toxicidade, pela
magnetizante, diluviana e suavizante reverberação bafejada por um oscilante
baixo de linhas desenhadas a sombreada volúpia, e pela redentora ritmicidade de
uma cintilante bateria progressiva que confere pulso e vida a toda esta exploratória
digressão que nos transcende tão para lá do lado eclipsado das fornalhas
estelares. ‘Perfect Dark’ é um álbum verdadeiramente mirífico que
me assoberbara e imortalizara num pleno estádio de alegre melancolia. Um
registo de narrativa dramática que seguramente aquecerá e embevecerá até o mais
gélido dos corações. Deixem-se massajar e deleitar pela inebriante sensibilidade
que percorre todas as artérias deste disco tão singular. A banda-sonora perfeita
para a doce solitude de atmosfera outonal que se avizinha está aqui, na
essência tristemente bela de White Shape. Deifiquem a vossa alma n'Ele.
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