Desenganem-se todos
aqueles que acham que este álbum fora gravado de forma analógica e produção lo-fi
numa decrépita e húmida cave situada algures no final dos 60’s / início dos 70’s,
e por lá ficara esquecido – a ganhar bolor e um nauseabundo odor durante meio
século – para só agora sair à rua com roupas datadas, cabelos desgrenhados e
olhares esfomeados. ‘It’s Heavy’ é o portentoso disco de estreia
dos jovens holandeses Supersonic Blues – tridente sediado na cidade
costeira de Haia e que nutre uma indiscreta e doentia obsessão pelo lado
mais raro e obscuro da velha música Rock forjada nas douradas décadas de 1960 e 1970 – oficialmente
lançado hoje mesmo pela mão da companhia discográfica germânica Who Can You
Trust? Records através do formato digital e de uma ultra-limitada edição em
vinil (apenas 300 exemplares disponíveis para venda). Tal como o nome de baptismo da
banda e o título do seu respectivo álbum assim o sugerem, este primeiro trabalho de Supersonic
Blues vem fervido por um fogoso, pesado, gaseificado e libidinoso Heavy
Blues hasteado à boa moda de Blue Cheer ou Cream,
centrifugado por um delirante, caleidoscópico, exótico e vibrante Psychedelic
Rock de coloração Jimi Hendrix’eana e groove Grand
Funk Railroad’eano, e ainda obscurecido por um encarvoado, intrigante,
dominante e amaldiçoado Proto-Doom a fazer recordar os primórdios dos
britânicos Black Sabbath ou Wicked Lady. A sua sonoridade destemperada,
poluída e desmaquilhada – de plena vocação vintage – espelha toda uma
crueza, imponência, ardência e rudeza que não deixará ninguém recostado à indiferença.
Na composição deste barulhento e fumegante vulcão em efervescente erupção perfilam-se
uma guitarra polposa – gaseificada pela suja e corrosiva distorção Fuzz
– que se agiganta em Riffs rochosos, dançantes e montanhosos, e derrapa
em solos gritantes, sinuosos e alucinantes, um baixo musculoso de reverberação
obesa, fibrótica e coesa, uma bateria estimulante de galope incessante, firme e
triunfante, e ainda uma voz ácida, esbranquiçada e fantasmagórica que sobrevoa as
bailantes lavaredas de toda esta vivaz e mordaz incandescência. ‘It’s
Heavy’ é um álbum verdadeiramente enrugado, saturado, genuíno e ritmado
que me preenchera as medidas. Deixem-se empoeirar, sobreaquecer e contagiar pelas psicotrópicas
ressonâncias – de balanço boogie e forte fragância retro – pesadamente
bafejadas por este tão promissor power-trio holandês, e balanceiem os
vossos corpos embriagados à atordoante boleia de um álbum que resvala nas
costuras fronteiriças da perfeição. O ano musical de 2022 não poderia
estrear-se de melhor forma, ou não fosse eu um intratável apaixonado por bandas
contemporâneas que conjugam a sua sonoridade no pretérito.
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