É numa
atmosfera enfumarada e de brilho festivo – na ressaca dos parabéns cantados, aplausos
calados e das vinte velas sopradas, referentes ao 20º aniversário desta banda
norueguesa – que se ouve o primeiro choro do recém-nascido ‘All The Better For Seeing You’, o esmerado 11º
trabalho de longa duração de Bushman's Revenge (e, devo já antecipar, o
meu favorito do apaixonante tridente nórdico). Saído à rua sob os formatos LP,
CD e digital – com o carimbo da jovem, mas muito promissora, editora local Is
it Jazz? Records – este novo álbum dos intratáveis Jazz cats
sediados na cidade-capital norueguesa de Oslo é capitaneado por um refinado,
elegante, deslumbrante e aromatizado Contemporary Jazz de folhenta,
orvalhada e pardacenta moldura outonal (a fazer recordar a cinematográfica sonoridade
do músico dinamarquês Jakob Bro) que ocasionalmente se metamorfoseia num aparatoso, esdrúxulo e efervescente Jazz Fusion à la Mahavishnu Orchestra e não dispensa a quente coloração de
um exótico, sumarento e tropical Psychedelic Rock de paladar oceânico a The
Mermen (mais concretamente ao neptuniano trabalho a solo do guitarrista Jim
Thomas), e a serpenteante condução de um dançante, exuberante e hipnótico Progressive
Rock de expressivas feições King Crimson’eanas. A sua sonoridade relaxante,
reflexiva, sedutora e prontamente conquistadora deixa o ouvinte de espírito
maravilhado, sorriso escancarado no rosto, olhar lacrimejante de expressão
nostálgica, e respiração capturada. Uma contemplativa, reparadora, comovente e
imaginativa passeata pelas planícies campesinas de frescura escandinava que se
espreguiçam debaixo de uma morna luz crepuscular e perdem no enevoado
firmamento. Na génese deste sagrado fármaco que nos massaja o cerebelo, afrouxa
o corpo e reconforta a alma, conversam, numa sublime simbiose instrumental, uma
guitarra – discípula dos virtuosos John Mclaughlin e Allan Holdsworth – que dedilha e
rendilha toda uma incontável e arrebatadora profusão de refrescantes, cristalinos, diamantinos
e deslumbrantes acordes condimentados a desarmante beleza e executados a imaculada
destreza, um murmurante baixo de linhas grossas, fluídas, sombreadas e
ondeantes que preenche com distinção todos os espaços amplos bem como os mais angulosos
das estéticas composições que lavram este disco, e uma bateria deliciosamente
jazzística, de toque saltitante, polido, inventivo e cintilante, que
tiquetaqueia com assombrosa soltura e irreverente postura esta autêntica
obra-prima. Este é um registo verdadeiramente edénico, farolizado por uma fina
sensibilidade e uma donairosa sagacidade, que me fascinara de uma forma avassaladora.
Foi um caso de amor à primeira audição, e o acumular de renovadas audições ainda
destapa novos e suculentos detalhes que só insuflam toda a piramidal reverência
que eu já nutro por este irretocável registo. ‘All The Better For Seeing You’
é um álbum precioso que não só conserva uma ébria e etérea fragilidade emocional
(capaz de petrificar o ouvinte), como explora – de forma temerária e
experimental – outros climas sonoros mais fogosos, ritmados e libidinosos que
nos rebaixam as pálpebras, rodopiam a cabeça e acaloram o espírito. Esta 11ª obra
de Bushman’s Revenge tem tudo o que mais desejo encontrar num álbum que
cruza a camaleónica música Jazz com (in)discretos vestígios psicadélicos e progressivos.
Um dos mais sérios candidatos a melhor disco do ano está aqui. Embrulhem-se nele.
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