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da produção de um novo álbum dos escandinavos Causa Sui vejo um renovado
motivo para sorrir e fazer explodir toda uma pirotecnia emocional. Tem sido assim ao longo das duas últimas décadas. Desde
2005 que a banda dinamarquesa – domiciliada na cidade de Odense –
materializa todos os seus já numerosos rasgos de inesgotável criatividade,
ostentando uma invejável fertilidade musical que resulta numa considerável,
admirável e heterogénea discografia detentora de um amplo espectro sonoro que viaja
o ouvinte de imersivos, anestésicos e deÃficos estádios contemplativos até
outros mais fogosos, vibrantes, rugosos e agressivos. ‘In Flux’ – o novÃssimo
álbum do quarteto, editado pela insuspeita El Paraiso Records através
dos formatos LP (entretanto já esgotado), CD e digital – representa mais uma sagrada
peregrinação de Causa Sui pelos vastos oceanos da introspecção. Um
bálsamo de consagração espiritual que comungamos e nos faz vogar pelas sossegadas,
mornas e translúcidas águas de um reconfortante, arejado, ensolarado e
deslumbrante Psychedelic Rock de suor latino entrelaçado num relaxante, hipnótico,
exótico e dançante Krautrock de inspiração germânica. Radiante, fluÃdo, acetinado e enfeitiçante,
‘In Flux’ é uma obra de estonteante e desarmante beleza ambiental – de clima
estival e sabor tropical – que nos ancora num imperturbável estado de ataráxica
sonolência. A sua sonoridade letárgica, nirvânica e seráfica – herdeira de
bandas como Grateful Dead, Santana, Malo, The Mermen, CAN, Agitation Free e Gila
– seduz, circunda e conduz o imaginário do ouvinte pelas paradisÃacas praias –
de afago mental e luzência virginal – onde reluz um dilatado e amarelecido Sol de
bafo quente, grasnam gaivotas que sobrevoam todo um imenso mar azul-turquesa de
ondas que desmaiam numa lenta rebentação espumosa, e se estende um extenso areal
de coloração bronzeada e textura aveludada onde enterramos os nossos pés e
arremessamos o olhar embriagado até onde a vista pode alcançar. Um polposo,
fresco, alaranjado e delicioso cocktail que ingerimos enquanto
perseguimos com o olhar maravilhado surfistas golpear, ziguezaguear e cavalgar
a crista das ondas durante um mágico crepúsculo que nos inunda de luz solar e de
uma inapagável sensação de pleno bem-estar. De lucidez embaciada e tomados por
uma leve embriaguez que nos eteriza e canaliza através de um delirante caleidoscópio
rodopiado a lisérgico psicadelismo, somos cativados e gravitados em órbita de
uma guitarra bailante que se espreguiça em acordes repetitivos, esponjosos, odorosos
e lenitivos, um baixo vagabundo de linhas ondeantes, sombreadas, delicadas e
magnetizantes, uma bateria cerimonial de ritmos desinibidos, acrobáticos, jazzÃsticos
e tribais, e um envolvente teclado de frescas, doces, leves e romanescas harmonias.
‘In Flux’ é um registo edénico, dirigido a fluidez, ligeireza, subtileza e
placidez. Filho de um ofuscante experimentalismo colhido no jardim cósmico,
este novo álbum de Causa Sui é um poderoso narcótico que nos liberta
numa transcendência divina. Um registo ternurento, meloso, lustroso e temulento
– habitado por atmosferas atraentes e misteriosas que se vão desvelando e
esclarecendo vagarosa e progressivamente – que nos massaja e viaja pelas perpétuas
planÃcies da reflexão. Destaco, com vaidade, o lÃmpido e sublime tema "Moledo" que faz uma merecida alusão ao SonicBlast (festival português do qual
sou orgulhosamente parceiro media e que tem lugar todos os verões na costa norte
de Portugal, gozando hoje de uma crescente reputação mundial) pelo qual a banda
nutre uma incomensurável estima, agora corporizada e imortalizada na sua música.
Percam-se e encontrem-se numa compenetrada dança pelos serpenteios enleantes
deste ritualista ‘In Flux’. Este é provavelmente o álbum mais zen de Causa
Sui e seguramente um dos mais bonitos e agradáveis da sua imaculada
discografia.
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