Que Alfred Hitchcock tenta privar as testemunhas dos seus
filmes de inalar oxigénio durante o desenrolar dos mesmos, já todos sabemos.
Mas impedir que o espectador inspire o fruto da vida durante 105 minutos,
chamar-lhe-ia de homicídio. Falo do seu esplendoroso “Dial M for Murder”, um
thriller sobrecarregado de suspense que, seguramente, domina todo aquele que
lhe dedicar atenção. Este belo exemplar da mais brilhante década que o cinema
conheceu, os anos 50, narra o antes, o decorrer e o depois de um crime mal
sucedido. Tudo começa com a notável persuasão de Tony Wendice para com o seu
colega de faculdade, Charles Swann. Tony, um marido desconfortável pela clara
traição da sua esposa Margot Wendice (com um talentoso escritor chamado Mark
Halliday), arquitecta uma forma (e que forma!) de assassinar a Margot,
recorrendo a Swann como o herói do seu crime - aparentemente – perfeito. Depois
de muito bem estudado, o seu plano elevava-o ao apogeu da confiança. Mas nem só
de um bom argumento se constrói um bom filme, e a noite do crime espelhou esta
mesma teoria de forma perdulária. O assassino não consegue vestir a roupa da
sua tarefa, e depressa se converte em assassinado pela esposa de Tony. Desde
logo, Tony é forçado a improvisar uma retórica “salva-vidas” que o afaste do
dedo indicador da justiça. Quando a azáfama policial parece ter acalmado, e a
resolução do crime parece estar a germinar com muita dificuldade, eis que
aparece a figura mais temível dos obreiros do crime: o inspector. De figura
imponente e com uma interminável sede de descoberta no âmago do crime, o inspector Hubbard bate à porta da família Wendice. Quando a
culpa parece calçar melhor em Margot e é consequentemente acusada de
assassinato, Tony vê-se importunado pelo amante da sua esposa, que o tenta
colocar no banco de réus em troca de Margot (usando exactamente o mesmo plano
que Tony edificou). Num jogo onde a verdade se reveste de ficção e, simultaneamente,
a ficção se reveste de verdade, é o inspector Hubbard quem decifra a verdadeira
história e intenções por detrás daquele crime. Num investigar mais perspicaz,
Hubbard dá voz a todos os elementos perversos que Tony julgava mudos.
Uma história estrondosa que envolve apenas cinco personagens com caracterizações soberbas e de estrutura bastante complexa. É o meu filme favorito do Hitchcock (o “Rear Window” que me perdoe), e um dos filmes que mais me cativa.
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