quinta-feira, 31 de agosto de 2017

Review: ⚡ Moongazer - 'Swimming in Mirrors’ (2017) ⚡

Da tropical cidade de Miami (Flórida, EUA) chega-nos o quente, envolvente e encantador álbum de estreia da jovem formação Moongazer apelidado de ‘Swimming in Mirrors’. Lançado no passado dia 21 de Agosto em formato digital através da sua página oficial de Bandcamp, este registo aprisiona um refrescante e paradisíaco Psych Rock de aura Pink Floyd’eana em agradável simbiose com um lisérgico e contemplativo Space Rock. A sua sonoridade ataráxica transpira um êxtase que nos sulfata a alma e a passeia por fascinantes paisagens estivais que se distendem e renovam ao longo de todo o álbum. São cerca de 65 minutos climatizados por um plácido e imperturbável deslumbramento que nos estaciona num pleno estádio de bem-estar. Mergulhem neste pacífico e profundo oceano de prazer e sintam-se dormitar ao xamânico som de uma guitarra melodiosa que se espreguiça em acordes solarengos, mélicos e delicados e se releva em solos vistosos, primorosos e arrebatadores, um baixo meditativo de linhas vigorosas, pausadas e dançantes, uma bateria jazzística de soberba orientação rítmica, uma voz aveludada, harmoniosa e cuidada, e um perfumado sintetizador que – aliado aos hipnóticos e afáveis bailados de um teclado - instaura todo um universo onírico na utópica ambiência de ‘Swimming in Mirrors’. Este é um disco edénico que nos bronzeia e enfeitiça com a sua sublimidade. Um registo atestado de propriedades terapêuticas que nos banha e deleita num perfeito oásis espiritual. Deixem-se envolver na refulgência deste psicadelismo primaveril e vivenciem a plenitude de um dos álbuns mais prazerosos de 2017.

Links:
Bandcamp

Abramis Brama - "Vad Jag Ser" (2001)

Thumlock - "Etherel Blue" (2000)

⛧ Pentagram ⛧

terça-feira, 29 de agosto de 2017

👊 Wo Fat - "Broke Down in Texas" (2013)

Dead Meadow @ Reverence Valada '16

Kadavar - 'Rough Times' (2017) via Nuclear Blast Records


Review: ⚡ SHC - 'SHC’ EP (2017) ⚡

No actual momento em que se testemunha uma forte disseminação do lado mais revivalista da música Rock em território português, SHC surge com uma proposta ousada e rebuscada que se desmarca da corrente sonora em voga para fundear a sua bandeira em território obscuro, pouco explorado até ao presente pelos músicos portugueses. Este EP de estreia do power-trio minhoto – natural de Ponte de Lima - nasce da extraordinária colisão entre o euforizante Heavy Psych, o poderoso Proto-Doom e o exaltado Punk Rock e promete ser um dos registos mais rodados do ano para todos os seguidores dos géneros anteriormente referidos. Baseado numa sonoridade sombria, cáustica e hipnótica que tanto se inflama e desgoverna em delirantes, entusiásticas e vertiginosas jam’s sem qualquer travão à vista como se arrasta vagarosamente numa pesada, robusta e morfínica avalanche de reverberação demoníaca capaz de nos narcotizar e profanar a alma, este ‘SCH’ representa uma tirânica cavalgada a duas velocidades que nos arrasa e absorve do primeiro ao derradeiro tema. São 38 minutos governados por uma intrigante e demoníaca liturgia superiormente rezada por duas guitarras hereges que se amuralham em riffs montanhosos, tenebrosos e soberanos capazes de nos sombrear e intimidar e se incendeiam em borbulhantes, ácidos e alucinantes solos que nos dilaceram, perturbam e extasiam, uma voz cava, ecoante e agressiva que emerge da caótica radiação instrumental para se enfatizar na infinidade espacial, e uma bateria troante de ritmicidade firme e estimulante que diligencia e esporeia com constância toda esta sinistra, ardente e melancólica digressão aos mais profundos abismos da nossa espiritualidade. ‘SHC’ é um EP irrigado de adrenalina que nos arremessa violentamente para o âmago de um conturbado vórtice capaz de nos esvaziar a lucidez e atestar de uma intensa e envolvente narcose. Chego ao fim do último tema completamente anestesiado pela funesta resplandecência que climatiza todo este EP e a desejar que o mesmo represente o primeiro capítulo de uma numerosa discografia. Montem a sela deste negro cometa e colonizem as trevas cósmicas.

Jus Oborn | Electric Wizard

sábado, 26 de agosto de 2017

Review: ⚡ Ruby the Hatchet - 'Planetary Space Child’ (2017) ⚡

Está finalmente lançado o terceiro e novo álbum dos norte-americanos Ruby the Hatchet apelidado de ‘Planetary Space Child’. Promovido e apadrinhado pelo afamado selo discográfico nova-iorquino Tee Pee Records sob a forma física de CD e vinil, este novo registo da formação natural de New Jersey ostenta um intrigante, luxurioso e ocultista Prog Rock de condução extravagante aliado a um envolvente, glamoroso e hipnotizante Proto Doom de ares setentistas que nos mantem de pupilas dilatadas e alma perplexa do primeiro ao derradeiro tema. A sua sonoridade imensamente etérea e sedutora – de essência ritualística – provoca em nós um efeito profundamente narcotizante que nos ensombra e adorna a lucidez ao longo dos 41 minutos de duração. Há algo de verdadeiramente divino, sublime e enigmático na natureza de ‘Planetary Space Child’ que me convertera prontamente em seu devoto seguidor. Baseado num exuberante órgão de provocantes, obscuros e magnetizantes bailados, uma deslumbrante guitarra criadora de majestosos riffs e delirantes solos, um baixo robusto de linhas torneadas, sólidas e ritmadas, uma bateria tonificante de acrobacias desenvoltas e sensacionais, e uma portentosa voz que transpira elegância, melodia e vigor, este ‘Planetary Space Child’ é de fácil digestão e imediata veneração. O fabuloso e copioso artwork de feições quiméricas que confere rosto a esta verdadeira obra-prima é da autoria do incontornável e predestinado Adam Burke. Este é um álbum verdadeiramente fascinante que nos prende e domina com enorme autoridade. Deixem-se intoxicar pela erótica e opulenta perversão de Ruby the Hatchet e rendam-se aos pés de um dos mais apaixonantes discos lançados em 2017.

The Murlocs - "Old Locomotive" (2017)

quinta-feira, 24 de agosto de 2017

⚰️ R.I.P. - "Unmarked Grave" (2017)

Duel (Heavy Psych Sounds) Euro Tour 2017

Sleep @ Psycho Las Vegas (2017)

Review: ⚡ Opium Heathen - 'Opium Heathen’ (2017) ⚡

Da cidade de Mechelen (Bélgica) chega-nos a veemente, erosiva, diabólica e narcotizante reverberação do instigante power-trio Opium Heathen com o lançamento do seu impactante álbum de estreia ‘Opium Heathen’. Neste disco homónimo – muito recentemente retirado da incubadora – reside e preside um monolítico, sombrio e prepotente Stoner Doom oleado por um denso, sinistro e inflamante Sludge Metal e ainda orientado por um enigmático, arrastado e extraordinário Heavy Blues de feições luciféricas que confere uma hipnótica sensualidade a toda esta redentora, musculada e impressionante ferocidade. A sua sonoridade agressiva, provocante, corpulenta e eletrizante é governada por uma constante, opulenta e perturbadora euforia que – inundada pelo ardente e erodente efeito fuzz – nos absorve, desgasta a lucidez e atesta de uma pesada, temulenta e nebulosa adrenalina. É de semblante caído sobre o peito, olhar selado e a alma entregue a um pesado entorpecimento que nos balanceamos na instintiva resposta a uma guitarra demoníaca que se engrandece em graníticos, sólidos e fumarentos riffs e se desvaira em vertiginosos, viscerais e estonteantes solos, um baixo poderoso e tenebroso que vocifera linhas possantes, dominantes e opressoras, uma bateria imensamente violenta locomovida a energia e emoção, e uma voz revolta, ecoante e cavernosa que se liberta e soergue de toda esta turva e psicotrópica bruma exalada pelas narinas de ‘Opium Heathen’ para detonarem nos mais longínquos céus estelares. Este é um álbum repleto de pujança que nos agride do primeiro ao derradeiro tema. Um indomável, brutal e monolítico tsunami que em nós colide, deixando-nos completamente soterrados numa profunda e imperturbável narcose. Enfrentem destemidamente todos os sintomas provocados por este dominante opiáceo e vivenciem toda a plenitude de um dos álbuns mais espetaculares lançados em território de 2017.

domingo, 20 de agosto de 2017

✿ Paz Lenchantin ✿

Review: ⚡ Weed Demon - 'Astrological Passages’ (2017) ⚡

Da grande e populosa cidade de Columbus (Ohio, EUA) chega-nos a psicotrópica radiação exalada pelo álbum de estreia do quarteto Weed Demon. Lançado no passado dia 18 de Agosto sob a forma física de CD e cassete (através da sua página oficial de Bandcamp), este extraordinário ‘Astrological Passages’ encerra um potente, brumoso e enraivecido Stoner Doom que nos atemoriza e narcotiza com intensidade e prontidão. A sua sonoridade imensamente provocante, despótica e psicotrópica absorve-nos numa turva, densa e lisérgica nebulosidade sobrecarregada de THC (Tetra-hidrocanabinol) que nos cerca, seda e mumifica de uma euforia contida. Num perfeito equilíbrio entre a anestésica e extasiante placidez e a selvática e redentora efervescência, ‘Astrological Passages’ convida-nos a vivenciar uma envolvente, fascinante e fumarenta digressão pela infinidade espacial. Na índole desta misantrópica fábula narrada pelos mais solitários astros estão duas guitarras que se auxiliam na edificação de riffs arrastados, musculados e colossais e se enfatizam na criação de solos caóticos, estonteantes e encantadores, um poderoso baixo de bafo reverberante, sombrio e possante, uma bateria impetuosa de ardente, hipnótica e empolgante ritmicidade, e uns vocais cavos, irados e fogosos que se atropelam mutuamente provocando uma vibrante e monolítica avalanche. ‘Astrological Passages’ é um disco irrepreensível que me cativara, excitara e conquistara à primeira audição. Um álbum desmesuradamente incitante que nos esporeia e incendeia de adrenalina. Enfrentem toda esta virilidade de Weed Demon e inalem a tóxica exalação bafejada pelo próprio demónio. Estamos mesmo na presença de um dos registos mais entusiasmantes de 2017.

Comacozer - 'Kalos Eidos Skopeo' (2017) via HeadSpin Records

quinta-feira, 17 de agosto de 2017

Queens of the Stone Age - 'Live Bites' (2001)

🔥 SonicBlast Moledo 2017: Dia 2 🔥

Depois de uma noite lúcida e barulhenta – celebrada nos mais diversos idiomas e das formas mais extravagantes possíveis – a manhã de Moledo era governada por uma contemplativa e apaziguante quietude só interrompida pelos estridentes ruídos dos fechos éclairs das muitas tendas plantadas no parque de campismo. O calor intensificava-se e o ambiente no interior das mesmas era cada vez mais irrespirável. As cabeças sonolentas de olhar temulento e narinas dilatadas surgiam de dentro das tendas inalando a refrescante brisa matinal que se passeava no exterior, e os mais corajosos cambaleavam decididamente até aos chuveiros de toalha apoiada no ombro. O derradeiro dia da presente edição do SonicBlast começava a configurar-se e todos os olhos atropelavam as horas da manhã para focarem o inicio da tarde. Depois de uma breve e tonificante caminhada junto à praia, um relaxado almoço numa pizzaria local e uma cerveja fresca bebida numa esplanada arejada, dirigi-me ao recinto do festival para presenciar os primeiros concertos do dia. Avizinhava-se uma tarde e noite repletas de concertos memoráveis e a expectativa agigantava-se em cada um dos muitos festivaleiros presentes em Moledo.

Vinnum Sabbathi | 14:25 | Palco Piscina
Provenientes da longínqua Cidade do México e de instrumentos apontados ao vertiginoso e incomensurável Cosmos, o quarteto mexicano Vinnum Sabbathi provocara em cada um de nós a sagrada levitação da alma rumo à profunda escuridade espacial, deixando para trás um corpo totalmente inanimado. Baseada num sombrio, poderoso, morfínico e frondoso Psych Doom brilhantemente temperado por um envolvente, misterioso, viajante e brumoso Space Rock que nos metamorfoseia em aventurosos astronautas, a lisérgica, portentosa e nebulosa sonoridade de Vinnum Sabbathi tem o dom de nos embrenhar de poeira estelar e arremessar pelos esplendorosos firmamentos da verticalidade cósmica. O numeroso público – de semblante caído, corpo baloiçante, e olhar lapidificado – estava verdadeiramente rendido a toda aquela etérea e fascinante odisseia admiravelmente orientada pela formação mexicana. A guitarra desenvolvia riffs possantes, obscuros e carregados, o baixo ondulava-se pesada e intensamente em linhas sólidas e torneadas, a bateria explodia em enérgicas e ofegantes incursões, e o sintetizador munido de samples celestiais autentificava toda esta digressão pelos insondáveis domínios situados no lado eclipsado da Lua. No final a banda exteriorizava o seu profundo agradecimento a tudo e a todos aqueles que haviam tornado possível o concerto de Vinnum Sabbathi no SonicBlast e viraram costas à plateia debaixo de um animado e demorado aplauso. 

Blaak Heat | 16:15 | Palco Piscina
O bafo solar intensificava e bronzeava toda aquela multidão que lotava o recinto da piscina, enquanto que uma das minhas bandas favoritas subia ao palco para instaurar em todos nós uma sagrada e resplandecente aura pérsica. Com as raízes divididas entre a França e os EUA, esta encantadora formação desenvolve um místico, hipnótico e apaixonante Psych Rock de ares arábicos que se entrelaça num requintado, fresco e estarrecedor Surf Rock capaz de nos remeter para firmamentos desérticos que se desdobram infinitamente debaixo de um Sol vigilante que nunca se põe. Numa fugaz digressão pelos últimos trabalhos da banda e uma pequena amostra do novo álbum que será lançado ainda este ano, os Blaak Heat envolveram, seduziram e entorpeceram Moledo com a sua sonoridade exótica regada de mescalina. Vivia-se uma perfeita ambiência religiosa e a nossa espiritualidade banhava-se num edénico oásis. As guitarras faraónicas serpenteavam-se por entre riffs intrigantes, enigmáticos e dançantes e solos extraordinários, inflamantes e sumptuosos, o baixo murmurante compenetrava-se em linhas oscilantes, corpulentas e magnetizantes, a voz macia e espectral sobrevoava livremente todo o instrumental e a estimulante bateria conduzia com leveza e habilidade toda esta prazerosa e imaculada peregrinação pelos sinuosos desfiladeiros da alma. Para mim, Blaak Heat foi – a par de Black Bombaim – o melhor concerto vivenciado no palco piscina.

Acid King | 21:15 | Palco Principal
De San Francisco (Califórnia, EUA) estavam aí os lendários Acid King e na plateia pressentia-se que deles viria uma das performances mais avassaladoras da presente edição do SonicBlast. E não estava enganada: este poderoso power-trio fielmente dedicado ao lado mais nebuloso, arrastado e psicotrópico do Doom Metal brindou todos os presentes com uma tirânica, lenta e potente cavalgada que – sem qualquer timidez – nos atropelou a lucidez e embriagou a alma. Os riffs reverberantes, sombrios e inquisidores faziam estremecer todos os muitos corpos oscilantes que se debatiam como podiam perante toda aquela pujante descarga Sabbath’ica. A musculada e liderante guitarra de Lori S. soltava uma sísmica, cáustica e narcotizante ressonância que nos absorvia, respirava e dominava com firmeza e influência, o baixo sombreava e revigorava todos os riffs com as suas linhas atléticas, corrosivas e torneadas, a bateria incendiava-se em ardentes, pesadas e empolgantes investidas, e a voz límpida, destemperada e visceral ecoava por entre a densa, ébria, demoníaca e brumosa radiação. As nossas cabeças sonolentas sacudiam-se pesadamente à boleia de toda aquela titânica galopada e vivenciávamos uma intensa narcose que só se desvaneceu quando os instrumentos se calaram e os monolíticos amplificadores se desligaram debaixo de um aplauso ensurdecedor. Acid King foram autenticamente demolidores acima de palco. Longa e gloriosa vida ao Rei.

Colour Haze | 22:35 | Palco Principal
Era a terceira vez que via Colour Haze ao vivo mas o meu coração comportava-se como se da primeira se tratasse. A influente e afamada banda alemã que desde os 90’s surpreende o panorama underground do Rock europeu pisava pela primeira vez na sua história um palco português e fora dele pressentia-se que a estreia desta formação germânica em território nacional ficaria imortalizada na mente de todos os afortunados que estavam prestes a testemunhá-la. Depois de um pequeno atraso no começo da actuação para que o seu técnico de som pudesse calibrar da melhor forma todos os instrumentos, Colour Haze deu então início àquele que viria a tornar-se indubitavelmente não só o melhor concerto do dia, como muito provavelmente o melhor de toda edição do SonicBlast. Ao primeiro contacto com o tema inaugural “She Said” Moledo mergulhou num profundo e intenso êxtase nutrido pelo lado mais requintado, mélico e apaixonante do Psych Rock. Vivia-se uma ambiência intensamente paradisíaca sublimemente condimentada pela harmoniosa fragância exalada do palco e na instintiva resposta o público siderado dançava detidamente de olhar selado, sorriso esculpido no rosto e narinas dilatadas. O sonho acontecia ali mesmo e todos nós fazíamos parte dele. Stefan Koglek manuseava a guitarra com uma magnificência incrivelmente paralisante, florescendo riffs desmesuradamente sumptuosos, primorosos e arrebatadores e desarmantes, estonteantes e inimagináveis solos capazes de nos atestar de uma insuportável euforia. O baixista Philipp Rasthofer de pálpebras cerradas e profundamente concentrado nas suas linhas oscilantes, volumosas e dançantes sombreava na perfeição o riff base, enquanto que o baterista Manfred Merwald se transcendia em deliciosas, inventivas e talentosas acrobacias que entupiam todas as zonas erógenas da nossa espiritualidade. A plateia estava completamente deslumbrada com toda aquela magia em estado musical. Depois de 5 temas tocados em pouco mais de 1h de duração, o power-trio dedicou uma prolongada vénia anunciando a sua despedida, mas público inconformado com o fim do concerto suplicava para que a banda regressasse ao palco. O mesmo não sucedeu mas para trás ficara um dos mais fascinantes concertos que presenciara em toda a minha vida. No final os meus ouvidos salivavam e a minha alma estava embaciada por uma embriagante sensação de bem-estar. Moledo inalara uma das mais encantadoras fragâncias sonoras de sempre e a ressaca da mesma ameaça agora resistir à força do tempo – perdurando na nossa memória pela vida fora – pois nem o esquecimento se esquecerá de a lembrar. Colour Haze foi uma autêntica ode epicurista.

Orange Goblin | 00:00 | Palco Principal
Seguiam-se os históricos Orange Goblin com o seu entusiástico, poderoso e vibrante Stoner Metal carburado a alta rotação. Assim que a banda londrina subiu ao palco sentiu no imediato que era uma das mais sérias responsáveis pela grande multidão que se encolhia no recinto principal. Este quarteto inglês liderado pelo extravagante Ben Ward – que passara todo o concerto a instigar os seus fãs – arrancou para uma exibição tremendamente imprópria para cardíacos. O ritmo do concerto nunca conheceu um travão e a ruidosa plateia exteriorizava de forma exuberante toda a adrenalina sentida. Fundamentados em riffs ferozes que nos desgastam e euforizam, os Orange Goblin foram verdadeiramente irrepreensíveis acima de palco. Nenhuma outra banda havia comunicado de forma tão calorosa com o público e o mesmo retribuía com variados focos de desgovernado alvoroço. A sonoridade fervorosa e contagiante da banda inglesa a isso nos obrigava e toda a plateia era levada nesta violenta torrente. Foi à excitante boleia de uma guitarra que se cimentava em riffs opulentos e volumosos e se superava em solos caóticos e extraordinários, um baixo potente de linhas carregadas e vociferantes, uma bateria explosiva e revoltosa de ritmicidade atordoante, e uma voz cavernosa, colérica e intimidatória que todos nós entrámos em estado de ebulição. Orange Goblin foi uma das actuações mais frenéticas não só da presente edição mas da história recente do SonicBlast. No final do concerto estávamos todos combalidos, ofegantes e ainda atordoados mas havíamos sobrevivido a toda aquela enfurecida avalanche de reverberação que fizera estremecer a pacata freguesia de Moledo.

A presente edição do festival SonicBlast foi uma renovada experiência marcante. Este é um festival de amor à primeira visita que tem abraçado e conquistado cada vez mais público. São vários anos de investimento no mesmo viveiro musical e essa ousada persistência faz hoje do SonicBlast um dos festivais mais relevantes e apaixonantes da Europa dentro da scene que nos move. O meu sincero obrigado à organização por isso.


*Um agradecimento especial ao Bruno Pereira (Wav.) pela cedência do registo fotográfico.

Arizona Highways (Nov. 1955)

terça-feira, 15 de agosto de 2017

Saguaro National Park @ Tucson, Arizona (USA)

✿ Woodstock ✿

✊ Jimmy Page | Led Zeppelin

🔥 SonicBlast Moledo 2017: Dia 1 🔥

O ano de 2017 encontrou o SonicBlast no ponto mais alto da sua história. A empolgante receita sonora apresentada pela organização para a presente edição do festival não deixou nenhum dos seus seguidores indiferentes e motivou uma enchente sem igual na pequena freguesia minhota de Moledo. O Sol respirava boa saúde – com o seu bafo a atingir a marca dos 30°C – e o oceano Atlântico trazia uma suave e fresca brisa marítima que avivava todos aqueles que – tal como eu – procuravam o espaço ideal para fundear a tenda. Os primeiros sintomas de que esta edição do SonicBlast iria superar todas as anteriores começaram a sentir-se ainda no campismo, com o mesmo completamente lotado de peregrinos musicais. Os trilhos arenosos que nos conduziam até ao âmago da floresta estavam emoldurados de tendas, geleiras e muitos festivaleiros de cerveja empunhada. Assim que martelei a última estaca da tenda confessei a mim mesmo que – ao contrário das restantes edições – este ano dificilmente conseguiria regressar à tenda no decorrer dos concertos (tal era a relação entre a qualidade e a quantidade das bandas acima de palco). Não foi fácil obedecer às necessidades básicas como comer, descansar e recorrer à casa de banho sem sentir uma pequena réstia de culpa por perder (pelo menos visualmente) alguns concertos, mas como contrariar esses desejos da nossa natureza seria humanamente impossível, tive de arquitetar um rigoroso plano de prioridades em relação às bandas da presente edição que não poderia perder por nada. Seguem-se os concertos que mais me marcaram (pela positiva, é claro) neste primeiro dia do festival.

Holy Mushroom | 14:25 | Palco Piscina
Foi através desta jovem formação espanhola que se iniciara o primeiro de muitos contactos cósmicos entre a nossa mente e o espaço sideral. Com o seu primeiro trabalho (review aqui) a nortear toda a performance de Holy Mushroom, este quarteto natural da cidade de Oviedo (Astúrias, Espanha) lançou-se para uma envolvente, ácida e delirante jam que nos empoeirara de matéria estelar do primeiro ao derradeiro tema. O público estimulado pela sua lisérgica e encantadora sonoridade acorria ao recinto e as últimas peças do puzzle humano começavam a posicionar-se rapidamente. A numerosa plateia – embriagada pelo narcotizante Heavy Psych de essência astral – balanceava-se harmoniosamente ao som de uma guitarra estarrecedora que se manifestava em alucinantes solos e enigmáticos riffs, um baixo groovesco de linhas pulsantes e dançantes, uma bateria diligente e um teclado de bailados celestiais que sulfatava toda a ambiência sonora com a sua aura espacial. Holy Mushroom fizeram por merecer toda a confiança neles depositada e presentearam-nos com uma hipnótica e agradável digressão pelos mais distantes, solitários e recônditos astros do negro solo cósmico.

Black Bombaim | 17:10 | Palco Piscina
Por mais vezes que experiencie ao vivo este power-trio barcelense (e já foram mesmo muitas) nunca me canso ou sinto o interesse esfriar. Antes pelo contrário. Cada um dos seus concertos tem uma invulgaridade própria que o diferencia dos restantes e, portanto, garantem sempre diferentes e fascinantes odisseias pelo mesmo universo de Black Bombaim. E a sua exibição no SonicBlast não fugiu à regra. Baseados numa hipnótica, sedutora e deslumbrante peregrinação sonora pelos quentes, dourados e sedosos desertos africanos, esta influente banda portuguesa adornou todo o público com o lado mais viajante, morfínico e extasiante do Psych Rock aliado ao extravagante, empolgante e libertador Free Jazz que superiormente foi desenhado e conduzido por um saxofonista. A plateia balanceava-se num perpétuo movimento corporal como resposta instintiva a toda aquela lubricidade musical. A guitarra distendia-se em estarrecedores solos e riffs ardentes, a bateria concentrava-se numa incessante e emocionante cavalgada, o baixo reverberante e magnetizante vociferava linhas pulsantes, musculadas e dançantes, e o saxofone transcendia-se em exóticos, desvairados e serpenteantes uivos que muito enriqueceram este verdadeiro safari pelos místicos domínios de Black Bombaim. Na piscina vivia-se um contagiante clima de boa disposição e seguramente um dos concertos mais arrebatadores do primeiro dia. Assim que desligaram os amplificadores e pousaram os instrumentos não foi nada fácil despertar de toda aquela intensa e profunda hipnose que nos abraçara, assaltara e dominara ao longo de toda a actuação.

The Great Machine | 18:00 | Palco Principal
Com parte da responsabilidade de substituir os germânicos Kadavar que poucas semanas antes haviam cancelado a sua presença no SonicBlast, estava o poderoso power-trio israelita The Great Machine que – devo já adiantar – provocara na plateia um dos momentos mais eufóricos do festival. Nenhum de nós estava física ou psicologicamente preparado para enfrentar toda aquela desgovernada explosividade que nos sacudiu violentamente ao longo de todo o concerto. Foram – para mim – uma das maiores surpresas (pela positiva) do festival e é muito graças a eles que as dores musculares nas pernas e pescoço ainda hoje perduram. Baseada num poderoso, atlético e inflamante Heavy Rock – tanto sombreado pelo arrastado, denso e vigoroso Psych Doom como esporeado pelo dinâmico, furioso e convulsivo Punk Rock – a selvática sonoridade de The Great Machine contaminara e conduzira todos os corpos que se agitavam em frente ao palco. A guitarra agigantava-se em riffs corpulentos, cáusticos e inquisidores, o baixo rugia pesadas, titânicas e torneadas linhas, a bateria trovejante orientava-se a potência e emoção e os vocais cavernosos e guturais completavam na perfeição toda esta volumosa, tóxica e tumultuosa descarga sonora. The Great Machine brindaram-nos com uma performance verdadeiramente arrasadora que despertara em cada um de nós toda uma colérica e saturada erupção de adrenalina.

The Well | 19:05 | Palco Principal
Este tridente ofensivo natural da cidade de Austin (Texas, EUA) representava uma das bandas por mim mais aguardadas do festival. Sendo um admirador confesso do primeiro álbum ‘Samsara’ (review aqui) mal podia esperar por vivenciar ao vivo – pela primeira vez – todo aquele luciférico, alucinógeno e enigmático Psych Doom entrelaçado num nebuloso e eletrizante Heavy Psych capaz de amortalhar, possuir e profanar a alma do ouvinte. E assim sucedeu: The Well materializara as mais altas expectativas que previamente lhes dedicara e arrancaram para uma performance irrepreensível que narcotizara e incendiara todos aqueles fiéis de olhos e ouvidos neles ancorados. O público – seduzido pela sonoridade - aproximava-se da frente do palco e exteriorizava tudo o que The Well nele provocava. Na índole desta pesada e psicotrópica cavalgada que nos atropelou sem qualquer moderação estava uma guitarra de riffs demoníacos, febris e vibrantes e solos extraordinários e delirantes, um baixo inquisidor de hipnóticos, atraentes e dominantes bailados, uma bateria fulgurante de entusiástica orientação rítmica e os vocais ecoantes, lisérgicos e penetrantes que imergiam da nebulosidade instrumental. Um dos concertos mais enigmáticos do SonicBlast.

Kikagaku Moyo | 21:15 | Palco Principal
Depois de todo o peso transpirado pelas bandas que até então haviam subido ao palco principal, chegara a vez de serenarmos e mergulharmos num profundo e aveludado oceano de ataraxia ao deslumbrante som dos nipónicos Kikagaku Moyo. Fundamentados numa sonoridade mântrica de onde sobressai um requintado, envolvente e encantador Psych Rock em alegre consonância com um magnetizante, sumptuoso e reconfortante Krautrock que nos massaja o cerebelo, esta adorável formação oriental conduziu a nossa espiritualidade aos braços do tão almejado transe. Moledo estava apaixonado e petrificado com toda aquela extasiante radiação que nos afagava e bronzeava a alma. As pessoas dançavam de olhar selado e sorriso talhado no rosto. O paraíso estava instalado em cada um de nós e vivia-se uma generalizada e imperturbável sensação de bem-estar. As guitarras dialogavam entre si desenvolvendo envolventes, agradáveis e comoventes acordes, a cítara envaidecia-se em solos verdadeiramente edénicos e estarrecedores, a bateria tribalista galopava com perícia e emoção, e a voz suave e espectral passeava-se livremente pelas etéreas e sublimes paisagens sonoras de Kikagaku Moyo. Nada poderia contrariar todo o arrebatamento brilhantemente cozinhado pelos japoneses e na plateia testemunhava-se um verdadeiro estádio de enlevação. No final do concerto – debaixo de um magnífico viveiro estelar – estávamos todos siderados com o que havíamos presenciado. Segredei a mim mesmo que Kikagaku Moyo havia dado o concerto mais tocante do primeiro dia. Foi imensamente lindo e a sublimidade do mesmo será levada por todos aqueles que o vivenciaram para o resto das suas vidas.

Monolord | 22:35 | Palco Principal
A pesada vibração estava de regresso ao palco principal e desta vez levada a cabo por um dos nomes mais sonantes da presente edição do SonicBlast. Os suecos Monolord foram autenticamente demolidores e desprenderam toda uma musculada, portentosa e absorvente avalanche decibélica que prontamente nos devastou a lucidez e arremessou a consciência para os mais fundos e sombrios precipícios da existência humana. A plateia enfrentava um potente tremor e – na tentativa de acompanhar a imensa ferocidade rugida acima de palco – manifestava-se com bruscos e extravagantes movimentos corporais. Foi à boleia do tirânico, passante e impetuoso Psych Doom de Monolord que vivenciei um dos momentos mais altos do festival. A imponente guitarra amuralhava-se em riffs pujantes, obscuros e monolíticos e em solos cáusticos e mirabolantes, o vultoso baixo de linhas viris, lentas e carregadas robustecia toda a atmosfera despótica, a bateria retumbante detonava poderosas, vagarosas e redentoras cadências, e a voz fecundante, límpida e visceral ecoava e assombrava toda aquela fumarenta e demoníaca obscuridade que nos governou ao longo de todo o concerto. As colunas estremeciam na passagem de toda aquela sísmica ressonância e os nossos corpos eram constantemente agredidos de forma impiedosa pela corrosiva e veemente reverberação. Monolord foi uma experiência tremendamente marcante e indubitavelmente um dos concertos mais explosivos do SonicBlast.

Elder | 00:00 | Palco Principal
Às doze badaladas o palco principal recebia um dos principais motivadores da inundação humana que a presente edição do SonicBlast recebeu. Os norte-americanos Elder visitavam Portugal pela primeira vez e o público suspirava de ansiedade. Eu transbordava de expectativa em relação a este concerto, não fosse Elder uma das bandas da minha vida, mas o mesmo acabou por não corresponder inteiramente ao que dele esperava. E isto porque estou emocionalmente acorrentado aos dois primeiros álbuns da banda e a mesma dedicou praticamente toda a actuação aos dois últimos álbuns, terminando – ainda assim – da melhor forma com a surpreendente inclusão do tema “Gemini”. Elder tem vindo a cortar com a vertente mais Doom’esca que caracteriza a raiz da banda e desenvolvendo e aprimorando uma veia mais Prog’ressiva para gáudio de muitos e desalento de tantos outros (como eu). Ainda assim não consegui tirar o olhar do palco e – principalmente – da superior condução do Nick DiSalvo ao volante de riffs hipnoticamente complexos e solos berrantes, vertiginosos e alucinantes que promoviam e nutriam toda uma dança de cabelos soltos na populosa e compacta plateia em frente ao palco. No seu apoio estavam um baixo de bafagem oscilante e vigorosa, uma bateria de firme orientação rítmica e uma segunda guitarra responsável por manter o riff sempre presente enquanto o Nick se transcendia num emaranhado de fascinantes, virtuosos e excitantes solos. No final do concerto as opiniões sobre o mesmo pendulavam entre o “muito bom” e o “bom” mas todas elas esbarravam num ponto em comum: Elder ao vivo é um espectáculo que todos deveriam comungar.


*Um agradecimento muito especial ao Bruno Pereira (Wav.) pela cedência do registo fotográfico.

quarta-feira, 9 de agosto de 2017

✝ Hand of Doom ✝

Review: ⚡ Frozen Planet 1969 - 'From the Centre of a Parallel Universe’ (2017) ⚡

É justo começar por dizer que Frozen Planet 1969 é hoje uma das minhas jam band’s favoritas e este power-trio australiano parece cimentar a sua posição na minha consideração com o lançamento do seu novo álbum ‘From the Centre of a Parallel Universe’ agendado para o próximo dia 30 de Agosto pela mão do selo discográfico local Pepper Shaker Records nos formatos físicos de CD e vinil. Depois de em Janeiro do presente ano ter aplaudido o fascinante ‘Electric Smokehouse’ (review aqui), esta formação sediada na cidade de Sydney obriga-me a repetir-lhe o elogio. Este novo registo prende um envolvente, hipnótico e extasiante Heavy Psych em alegre consonância com um gélido, ébrio e anestésico Space Rock que – traduzidos e unificados numa fluída, relaxada e extensíva jam – nos sidera e ancora a um pleno e firme estádio de ataraxia. A sua sonoridade temulenta, prazerosa e delirante tem o dom de nos atrelar a ela e vivenciar uma das mais arrebatadoras boleias pelos mais distantes, solitários e recônditos lugares do Cosmos nebuloso e narcotizado. Subam para a sela deste cometa e inalem toda a poeira estelar de ‘From the Centre of a Parallel Universe’ ao deslumbrante som de uma guitarra canonizada pelos astros que se manifesta em sidéricos, agradáveis e mântricos riffs e inventivos, psicotrópicos e estarrecedores solos conduzidos pelo experimentalismo, uma bateria descontraída, ligeira e acrobática de tonificantes incursões, e um baixo de reverberação oscilante que mareia a lisérgica aragem cósmica deste álbum com as suas linhas dançantes, robustas e murmurantes. De salientar ainda o místico, revivalista e elegante artwork brilhantemente delineado pela artista australiana Harley and J que confere rosto a esta penetrante e aveludada odisseia. Este é um disco que nos viaja a consciência pelo lado eclipsado da lua, deixando para trás o nosso corpo despido, vazio e desmaiado. Deixem-se flutuar pela calma e sedativa corrente de ‘From the Centre of a Parallel Universe’ e sintam-se canalizar a vossa espiritualidade aos sagrados braços do tão almejado transe. Um dos álbuns mais magnetizantes e narcotizantes de 2017 está aqui, na nova digressão espacial de Frozen Planet 1969.

✨Hypnos 69 - "Requiem (For A Dying Creed)"

Blaak Heat - "Al-Andalus" (2017)