É justo
começar por referir que os dinamarqueses Mythic Sunship são uma das
minhas bandas contemporâneas de eleição, e, portanto, foi com um sentimento de
frustração que reagi ao inesperado cancelamento da sua actuação (por motivos de
saúde) na passada edição do SonicBlast Fest, adiando para data indefinida
a minha estreia no que diz respeito a experienciá-los ao vivo. Com mais de uma
década de produtiva existência onde plantaram e colheram duas mãos cheias de
álbuns, o quinteto escandinavo acaba de nos presentear com o lançamento do seu
décimo trabalho, intitulado ‘Light/Flux’ e promovido
sob a alçada do renomado selo discográfico nova-iorquino Tee Pee Records
através os formatos físicos de LP e CD. Navegando pelas tranquilas águas de um pastoral,
contemplativo, imaginativo e ambiental Psychedelic Rock com vista para a
perpétua noite astral, e pelas areias movediças de um extravagante, sedutor,
libertador e deslumbrante Avant-Garde Jazz (in)disciplinado por um exótico
experimentalismo, a fluída, etérea e lânguida sonoridade de ‘Light/Flux’
acaba invariável e ocasionalmente por desaguar nas paradisíacas praias do seu autoproclamado
Anaconda Rock, caracterizado por Riffs volumosos, musculosos e
serpenteantes que nos caçam, abraçam e asfixiam. De olhar semi-selado, revestido
a uma embriagada expressão sonhadora, sorriso inquebrável, corpo baloiçante e
espírito enternecido por um transbordante estádio de perfeito bem-estar, somos
envolvidos, sublimados e canalizados pelos nirvânicos trilhos de Mythic
Sunship sem a mais pequena vontade deles regressar. São 43 minutos onde as
distâncias entre a gélida e vaporosa dormência e a vulcânica e gasosa efervescência
se encurtam, embalando o ouvinte numa extasiante hipnose de beleza crepuscular.
Farolizados pelos estonteantes ziguezagues rabiscados por um irreverente saxofone
de sopros gritantes, luminosos, sedosos e mirabolantes, pelos cativantes diálogos
travados entre duas guitarras aquosas e ecoantes que se perseguem em admiráveis,
esvoaçantes, encaracolados e inesgotáveis solos de toxicidade a perder de vista,
pelos polposos murmúrios bafejados por um ondeante baixo de linhas magnéticas, sombreadas,
oleadas e elásticas, e ainda pelo imersivo tic-tac de uma bateria soberbamente
jazzística que trauteia entre o quente brilho dos pratos, o acrobático rufar da
tarola e o galope tribal dos timbalões, somos engolidos pela negra boca do
Cosmos e deixados à deriva na infindável vacuidade. ‘Light/Flux’ é um
álbum de natureza anestésica, arejada, dilatada e sidérica que nos enleia e inebria
com a sua reconfortante, quimérica e enfeitiçante maviosidade. Recostem-se
confortavelmente e dissolvam-se tranquilamente no universo de um álbum
sem fundo, oxigenado a incontáveis propriedades terapêuticas.
Links:
➥ Facebook
➥ Bandcamp
➥ Tee Pee Records
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