O tridente italiano
Cancervo está de regresso com o lançamento do seu segundo trabalho de
longa duração ‘II’ pela mão da discográfica, sua conterrânea, Electric
Valley Records através dos formatos LP e digital. Inspirados e fascinados
pelas fantásticas lendas e tradições seculares do Monte Cancervo (uma
icónica montanha rochosa, localizada na provÃncia italiana de Bergamo, com quase dois
mil metros de altura) que os locais foram doutrinando e propagando de geração
em geração, o intrigante e hermético power-trio Cancervo
encarvoa-se agora na intensa e crua pretura de um bolorento, crÃptico, decrépito e
sarnento Doom Metal de estirpe setentista e crença ocultista, deixando, assim, para trás o obcurantista Heavy Psych que adubara o seu álbum de estreia. Adensando
e vagueando toda uma melancólica, fúnebre, trevosa e vampÃrica escuridão que
nos abraça, empalidece o rosto, encova as órbitas oculares, profana a alma, e faz
cair numa perversa tentação, estes três cavaleiros do apocalipse convertem a sua
enigmática sonoridade numa demonÃaca liturgia onde ninguém se recusará a comungar.
De religiosidade eclipsada, semblante tombado sobre o peito e soterrados num inquebrável
estado de sonambulismo, seguimos – devotos – uma despótica guitarra de monolÃticos,
atemorizantes, opressivos e enfeitiçantes riffs de onde serpenteiam solos
luzidios, azedados e esguios, um baixo sisudo de reverberação modorrenta, obscura
e corpulenta, uma frÃgida bateria obsessivamente vergastada a uma ritmicidade continuada,
tribal e compassada, e uma voz monocórdica de postura severa, autocrata e sacerdotal.
São 35 minutos mumificados por uma lúgubre caligem de fragância mântrica. Uma
musicada oração ao paganismo. Uma peregrinação, de olhos vendados, pelos abismos
Рtingidos a saturada negrura e oxigenados pelo sil̻ncio sepulcral Рda nossa
mente. ‘II’ é um álbum amargurado que deve ser escutado, prostrados, na
penumbra. Um registo hipocondrÃaco, portador de uma elegÃaca atmosfera onde a
esperança deÃfica e salvÃfica não medra. Refugiem-se no interior do sombrio manto de Cancervo
e desventurem-se nos amaldiçoados meandros do seu calvário.
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